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Chantal James nasceu no Canadá, se formou em fotografia pela Parsons School of Design, em Nova York, e em 2005 decidiu cumprir um sonho antigo: morar no Rio de Janeiro. O objetivo inicial era uma reportagem para a revista “La Rampa”, publicada no Canadá, Estados Unidos, Espanha e Brasil, mas, em pouco tempo, Chantal se surpreendeu com as assimetrias da cidade e com os meninos de rua, sem casa, sem família e sem comida, que deambulam por entre as casas, os hotéis e os restaurantes mais caros do Rio: “todo mundo vê, mas ninguém parece se importar”.
O Hypeness quis saber mais sobre o que levou esta fotógrafa canadense ao projeto “The Undesirables” (“Os Indesejados”), feito em parceria com os meninos do Rio ao longo de sete anos, e fez uma entrevista com a fotógrafa. Confira:
Chantal James (CJ): “Eu sonhava em vir para o Brasil há anos e minha ideia sobre as favelas era, provavelmente, qualquer coisa entre o “Orfeu Negro” [filme da década de 50, de Marcel Camus] e a “Cidade de Deus” [de Fernando Meirelles, já no século XXI]. Tinha publicado trabalhos sobre Cuba e Haiti, então eu me sentia preparada para o que me esperava no Rio. Mas acabou sendo bem diferente do que eu imaginava. Muito maior, mais sofisticado… Eu não estava preparada para a disparidade”.
Foi depois de alguns meses vivendo as dificuldades da zona Norte da cidade, principalmente as longas jornadas nos ônibus que atravessam a Avenida Brasil (“de noite, tinha um medo infernal”), que Chantal decidiu se mudar para a Rocinha. Ali, perto da praia, do trabalho, da vida carioca que atrai milhares de turistas, mas também do lado negro do tráfico, da droga e do crime, a fotógrafa se cruzou com Serginho, uma criança de 14 anos que mudaria definitivamente sua relação com a cidade.
CJ: “Eu comecei quase por acidente. Estava fazendo jogging pela manhã em Ipanema, quando vi um menino tentando atravessar a estrada com um cachorro. Foi nesse momento que o cão foi atropelado e morreu. Foi uma cena incrivelmente triste e o pobre menino estava destroçado. Mais tarde, eu conheci um outro garoto que tinha um cachorro para vender e, de repente, quando procurava de novo o primeiro menino para tentar juntar os dois, começaram aparecendo todas essas crianças maravilhosas. No começo, me apavorei um pouco, mas elas eram todas tão engraçadaos e amigáveis, que agarrei na câmera e saí fotografando com elas”.
Uma dessas crianças era Serginho, “o garoto que realmente tomou meu coração”. Estava fazendo “surf no teto do trem” quando sofreu um acidente que o deixou com graves lesões. Entre elas, a perda dos dois braços. “No começo, era muito difícil para mim não tentar ajudá-los, então eu passava muito tempo procurando abrigos para eles ou mesmo enfermeiras que pudessem cuidar das feridas do Serginho”. Numa das idas ao Canadá, Chantal conseguiu trazer próteses, mas quando voltou, Serginho tinha sido preso. “Ele era suspeito de ter cometido um assalto, sem braços…”.
Tal como ele, muitas outras crianças são esquecidas pela sociedade – “elas não contam e não são responsabilidade de ninguém”. No entanto, Chantal não quer apontar o dedo: “ao longo dos anos, eu tive que aceitar que isso é um problema muito complexo, sem solução fácil. Acho que muitas pessoas ignoram estas crianças por medo e até desespero, e eu entendo essa reação”. É preciso ir à raiz dos problemas, alerta: “a pobreza, a desigualdade, a educação deficiente, a falta de acesso a planejamento familiar, só para citar alguns…”.
Depois de algum tempo vivendo no Rio, Chantal percebeu que não conseguiria mudar tudo e decidiu fazer o que melhor sabe para chamar a atenção para os ‘meninos invisíveis’. “Não sou assistente social, sou fotógrafa”, e por isso criou o projeto “The Undesirables”, onde estas crianças podem finalmente ser apenas isso, crianças. O projeto inclui fotografias, vídeos e uma exposição sobre a vida nas ruas.
CJ: “Há tantas coisas que me impressionaram nestes meninos. O sentido de humor e a resiliência, a generosidade, o amor deles”.
Chantal sabe que muitos deles tomam atitudes perigosas. A própria fotógrafa quase foi presa, em 2010, quando fotografava dois dos “seus meninos” sendo detidos. “Eles [os policiais] usaram realmente a força. Acabaram me deixando ir quando eu entreguei todas as fotografias que tinha feito”.
A canadense explica ainda que deu sempre uma cópia impressa das fotos às crianças que clicava: “eu gostaria que todas elas pudessem ter um álbum de fotos pessoal, que lhes permitisse ter orgulho nelas próprias, mesmo na situação dura em que vivem”.
Para saber mais sobre o trabalho da fotógrafa, que ainda vive e trabalha no Rio, agora com o marido, dois filhos e a mãe, clique aqui.
Todas as fotos © Chantal James
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