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Os primeiros tempos de Andréa Werner Bonoli como mãe de Theo pareciam iguais aos de tantas outras mulheres: as músicas que ele adorava cantar e os primeiros sons que conseguia reproduzir enchiam qualquer mãe de orgulho. Mas um dia vieram as perguntas do médico: “Ele te chama? Ele chama ‘mamãe’? Ele pede água?”. “Não doutor, ele não faz nada disso”. Nesse momento começava a maior aventura da vida de Andréa.
Depois da sensação de desespero inicial, Andréa decidiu encarar o problema do filho como um desafio, registrando as dúvidas, os medos e as evoluções do pequeno Theo. Criou o blog Lagarta Vira Pupa para tentar “ajudar pessoas na mesma situação, dividir angústias e alegrias e documentar a rica história do meu menininho”.
O Hypeness quis saber mais sobre a história desta mulher que soube inovar na hora de ser mãe.
Hypeness (H) – Qual é a primeira coisa em que uma mãe pensa quando descobre que tem um filho autista?
Andréa (A) – A primeira coisa que passa pela cabeça é uma negação em meio ao pânico. “Não, não o meu filho. Meu filho não é autista. Meu filho não pode ser autista”. É uma dor difícil de descrever. A gente encomenda o bebê e faz vários planos pra ele. Isso é natural: vai estudar na escola tal, vai fazer intercâmbio quando tiver x anos, vai ganhar um irmãozinho com 2 anos. Quando um médico te fala “seu filho tem transtorno global do desenvolvimento” (que era o nome técnico do autismo na época), é como se estivesse pegando todos os seus sonhos, suas certezas, e jogando no lixo.
H – O que mudou na sua vida com a chegada do Theo?
A – Theo veio realizar meu grande sonho de ser mãe. Veio me mostrar que, mesmo lendo e me preparando bastante durante a gravidez, eu não sabia nada. Veio inverter totalmente minhas prioridades. Eu acredito que o caminho natural é que os filhos transformem os pais em pessoas melhores. Um filho com necessidades especiais, então, vem para te mudar totalmente, te mostrar o que é realmente importante na vida, te dar outros olhos, outros interesses, outras amizades, outros horizontes. Se você ficar preso à amargura da perda do filho idealizado, é porque não entendeu nada mesmo. Está perdendo uma grande oportunidade na vida.
H – Como surgiu a ideia, e qual o objetivo, do blog?
A – Eu sempre trabalhei em grandes multinacionais e, logo após o diagnóstico do Theo, aos 2 anos, eu ainda estava no mundo corporativo. Foi quando percebi que isso não daria muito certo. Theo ia para as terapias com a babá de táxi, eu não tinha muito tempo para acompanhar o que estava sendo feito com ele e se ele estava, de fato, progredindo ou não. Ao sair do último emprego, resolvi repensar a vida. E, para ocupar a cabeça, veio a ideia do blog. Mas nunca imaginei o blog como uma coisa de grande repercussão. Era mais um espaço para o meu próprio desabafo, para que eu aliviasse minha carga interna. Achei que, no máximo, a família iria ler. Mas as redes sociais propiciam esse tipo de coisa: uma pessoa lê, gosta, e compartilha no Facebook. Os amigos lêem e fazem o mesmo. E, quando fui ver, a coisa tinha tomado uma dimensão que eu nunca imaginei.
H – Como você acha que as outras pessoas vêem o autismo? E como você gostaria que as pessoas vissem o Theo?
A – Os pais de crianças autistas, geralmente, se dividem em 2 tipos: os que veem o autismo como uma maldição, uma deficiência, e os que preferem encarar como “um jeitinho diferente de ser”. Eu não sou nem um pouco maniqueísta. Acho que, entre o preto e o branco, existem vários tons de cinza. Tento passar para os outros pais a minha visão de que o autismo faz parte do meu filho. Não dá para separar ele do autismo. E ele traz muitas dificuldades no dia a dia, mas traz, também, características únicas e interessantes que enriquecem quem o Theo é (como seu olhar super apurado, seu jeito de achar graça nas coisas mais simples, sua maneira de sentir o mundo de forma muito mais intensa).
Quanto às outras pessoas que não conhecem nada sobre o autismo, queria que vissem o Theo como a criança encantadora, carinhosa e, muitas vezes, travessa que ele é. Na verdade, ele tem mais pontos em comum com as outras crianças do que diferenças. Ele gosta de brincar, passear, tomar sorvete, comer pipoca, ir comprar brinquedos, pular na piscina. Toda criança tem seus pontos fortes e suas dificuldades. Com o Theo, não é diferente. O tipo de dificuldade é que o diferencia das outras crianças.
H – Qual a melhor forma de lidar com uma criança autista?
A – Para começar, não se sinta ofendido ou chateado se falar com a criança e ela virar o rosto ou as costas e agir como se nem tivesse ouvido. Como eles têm dificuldades de interação, pode parecer que não te deram bola, mas eles prestam atenção em tudo. E, mesmo que a criança não falar, ela entende! Jamais fale dela como se ela não estivesse ali!
Muitos dos comportamentos inadequados são pela falta de habilidade social e pelas dificuldades de comunicação. Se a criança autista empurra o coleguinha, pode estar só tentando interagir. Cabe à gente ensinar a maneira mais apropriada para ela fazer isso. E, acima de tudo, explicar para as outras crianças que o Theo ou o João ainda estão aprendendo a falar, a brincar, a interagir. Quando você fala isso para a criança, em geral, ela sente vontade de ajudar, e isso é ótimo!
H – De que forma as pessoas podem ajudar o Theo e outras crianças autistas?
A – Todo mundo tem válvulas de escape para o stress: uns balançam os pés, outros enrolam o cabelo, estalam os dedos. Os autistas também fazem isso, só que forma diferente e mais evidente: uns balançam as mãos, outros dão pulinhos, outros fazem barulhos. Aceitar essa diferença é o primeiro passo para ajudar qualquer autista. É importante também aprender a não julgar. Aquela criança se jogando no chão e esperneando no meio do shopping pode ser um autista com uma sobrecarga sensorial. O nosso primeiro impulso é sempre pensar que a criança é mal educada. Precisamos de menos gente encarando nossos filhos e de mais gente oferecendo ajuda. Outra forma importante de ajudar é colaborando com as ongs que fornecem tratamento gratuito a crianças autistas carentes. O Projeto Amplitude, de São Paulo, faz um trabalho maravilhoso, mas depende totalmente de doações para continuar funcionando.
H – Vocês vivem fora do Brasil e agora vão mudar de novo de país [da Inglaterra para a Suécia]. Como é que ele convive com as mudanças?
A – Autistas, em geral, se prendem à rotina como aquilo que traz segurança, já que o mundo, pra eles, é bem caótico. Mudança nunca é algo simples. Mas o Theo tem reagido melhor do que a gente imagina. O grande lance para o Theo é mantê-lo ocupado. Se ele já chegar lá e tiver uma escola para ir e atividades para fazer, isso vai minimizar bastante o impacto da mudança. Tento ver pelo lado positivo: estamos, justamente, trabalhando esse lado dele para que ele se torne uma pessoa mais flexível.
H – De que é que o Theo mais gosta? Quais as atividades pelas quais ele mais se interessa?
A – Theo é fascinado por água. Se ele vir uma poça de água na rua, ele quer entrar. Até por isso, colocamos ele na natação. É uma questão de segurança. Aqui em Londres, estamos no verão e ele passa grande parte do tempo na piscina inflável no quintal. O trampolim do quintal também está lá por causa dele, que ama pular. Ele também gosta muito de brincar com o Ipad. Antes, só via vídeos. Agora, se interessou de verdade pelos aplicativos e vejo ele mexendo em coisas que nem eu sei mexer! Theo também é um passeador nato. Se você o colocar no carro, no ônibus ou no trem, ele é uma criança feliz. Adora passear, é muito observador, fica o tempo todo olhando pela janela. Theo também é bom de garfo!
H – Quais as melhores recordações ou episódios que guarda destes anos com o Theo?
A – Já vivemos tanta coisa juntos que é engraçado pensar que ele só tem 6 anos. Eu firmei um propósito comigo mesma de não colocá-lo em uma redoma de vidro. Ele vai comigo pra todo lugar. Inclusive, em fevereiro desse ano, fomos sozinhos para a Holanda visitar uma amiga e, de lá, fomos à Alemanha e à Bélgica. Se houve momentos em que ele se cansou, se frustrou, chorou, deu trabalho? Claro que sim. Mas o saldo foi muito mais positivo que negativo. E nenhuma criança vai aprender a conviver em sociedade ficando presa em casa. Da mesma forma que a sociedade não vai aprender a lidar com as diferenças se elas ficarem longe dos olhos.
Para seguir o Lagarta Vira Pupa, o blog onde Andréa compartilha o dia a dia e as conquistas de Theo, clique aqui.
Todas as fotos © Andréa Werner Bonoli
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