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Ouvir o nome Cripta Djan pode dar dor de cabeça para alguns. O pixador já colheu muitos processos jurídicos e comprou muitas brigas ao longo dos 20 anos em que optou pelo spray para dar voz a si mesmo. Em São Paulo, ele se constrói agora como artista e expõe pela primeira vez no recém inaugurado escritório de arte Humanar. A mostra “Em Nome do Pixo” relembra parte de sua história e reúne telas novas.
Nascido no bairro Bela Vista, região central da capital paulista, Djan Ivson virou um “Cripta”, codinome do coletivo do qual faz parte, um ano após ingressar na pixação, em 1997. Com todo o gosto e adrenalina que a modalidade traz, chegou a escalar arranha-céus com mais de 30 andares sem auxílio de nenhum equipamento de segurança e então se consagrou dentro da pixo.
Em 2004 iniciou seus trabalhos de documentação, que seguem até hoje, lançando vídeos sobre o movimento, até que em 2008 passou a liderar invasões de grupos de pixadores, como aconteceu na Escola de Belas Artes e na Bienal Internacional daquele ano, episódios bem polêmicos e um tanto engraçados. Assim passa a responder por uma comunidade inteira de pixadores que almejam um espaço para além dos muros.
Ironicamente, foi convidado para a própria Bienal em 2010 e em 2012 chegou até a 7ª Bienal de Berlim. Na 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2015, foi premiado pelo filme “Pixadores”, que retrata sua vida. Neste ano, além da primeira exposição individual no Brasil, também assina a primeira exposição de pixo no Estados Unidos, “From the Periphery to the Centre”, em cartaz em Nova York.
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Tantos capítulos dessa história culminam na mostra da Humanar, revelando a ascensão periférica e marginal, mostrando que pessoas da periferia podem ocupar espaços que são negados a eles, segundo o próprio Djan. Pelas paredes vemos uma porção de processos judiciais que já respondeu, fotografias, vídeos e novos trabalhos que marcam sua trajetória.
Para quem pensa que ele “se vendeu”, existe uma resposta na ponta da língua. “Por que só artistas bem nascidos e ricos podem vender? Acho um discurso classista e uma hipocrisia. Os burgueses ocuparam quase todos os ambientes sociais e o conceito deles era a venda. Então, os pixadores estão criando também seu próprio mercado e um meio de auto sustentação. Estamos potencializando a nossa cultura”.
Apesar de estar se inserindo no mundo da arte, o artista complementa dizendo que não é pixo propriamente dito que está ali e sim o trabalho de um artista que veio da pixação e que está fazendo a transição de uma linguagem para este campo. “A ideia dessa exposição é mostrar que o pixador tem condições de ocupar outros espaços além da rua, usando tanto o registro do que ele produziu, como um trabalho sobre tela também com a linguagem pixo. Porque o pixador é visto como um delinquente, um vândalo que não tem nenhuma qualidade artística. Então essa mostra é para fazer esse contraponto”.
Traços polêmicos
O assunto traz à tona aquela velha história: pixo é arte? Para o marchand e produtor da exposição, João Correia, sim. “Acho que é uma arte da melhor qualidade, por isso estou exibindo no meu espaço. O meio das artes está sempre atrás de vanguarda, de transgressores, de gente que disrompe e mostra inovação, mas eles acabam buscando novidades em ambientes seguros, acadêmicos e institucionais, que são ambientes controlados, onde um pensamento que tem uma perspectiva nova às vezes não entra. O encontro com o pixo na cidade é diário, mas descartado e ignorado, porque é apresentado de uma forma que as pessoas não acham sofisticada. Aqui proponho essa nova leitura e aqui dentro eles acham lindo“.
Este pensamento é confirmado não só pelo fato de que quase todas as telas foram vendidas, mas também pela fachada da galeria, que teve intervenção de Djan. Diferente de outros prédios pixados, as pessoas aprovaram o que foi feito. “Temos várias fachadas de pixadores que muitos acham que não é arte e sim delinquência, e aqui temos uma fachada feita do mesmo jeito, que dialoga com as fachadas vizinhas, e as pessoas acham que é arte”, finalizou João. O artista conta que dessa vez, enquanto pintava, recebeu até elogios. “Às vezes o pessoal apontava para o que estava do outro lado da rua dizendo que aquilo não era legal e a fachada da galeria sim. E eu falava que era a mesma coisa”.
Essa questão é tão enraizada na cultura contemporânea que segue quase como um mantra ao longo de teses, reportagens, críticas e no pensamento popular, que teima em odiá-los. Pois saiba que, para o “azar” geral da nação, é exatamente isso que move esse movimento chamado pixo. Uma conversa com Djan é suficiente para entendermos como se costura essa sopa de letrinhas pelos muros da capital paulista e de tantas outras. “O pixo é um misto de várias coisas. A revolta, a resistência, a questão artística, o vandalismo, a promoção existencial, a ocupação da cidade. São vários argumentos que constituem esse movimento, várias vertentes. É um movimento democrático com muitas mentes pensantes e ideologias, mas que têm o mesmo propósito que é ocupar a cidade que nos foi negada”.
O conceito do pixo é, para os mais ignorantes, deixar a cidade feia. Ninguém quer ver aquelas letrinhas pintadas em sua propriedade privada. Mas aí entram alguns questionamentos, nem sempre feitos por parte de quem foi alvo da pixação. “Costumo falar que o muro veio primeiro, por isso que a pixação existe. Ele não é construído pra gente pixar e sim para separar as pessoas. Quando você ocupa um muro que foi feito para separar, está juntando as pessoas mesmo que seja através de um conflito. Mas você também está reinvidicando o uso público daquilo. O muro é mais autoritário do que o pixo, porque ele é uma intervenção privada e permanente no espaço público. O pixo é efêmero e instrumento de reinvidicação”
João aponta que a falta de diálogo é um dos obstáculos entre sociedade que nega a pixação como expressão e pixadores que vandalizam seus espaços. “Eu acho que a nossa cultura precisa trabalhar o máximo possível para gerar diálogos entre diferentes comunidades, grupos e perfis. Acho que colocar o pixo dentro desse espaço, viabilizamos esse diálogo. O pixo ser discriminado e demonizado eu acho inaceitável porque a gente precisa se ouvir. Então aqui é um espaço confortável para exercitar a escuta, para quem não está disposto a ouvir”.
Djan concluiu o pensamento dizendo que “é legal porque o pixo questiona de uma forma pacífica, porque existe um conflito simbólico através de uma intervenção estética. Não pixamos pessoas, pixamos parede”. Ou seja, quem paga pelas agressões, na maioria dos casos, é a própria pessoa que aponta o movimento como uma barbárie. “As pessoas foram todas educadas num conceito burguês e capitalista, que as ensinou a serem muito individualistas, a viverem na sua ilha, no seu muro. O pixo vem na contramão disso e questiona: já que o espaço é público, até onde vai o direito de uma propriedade privada? O muro pode e o pixo não?”.
Na sociedade em que vivemos, é normal o isolamento cada vez em maiores proporções. Quem pode, o compra, seja em condomínios onde há absolutamente de tudo dentro, ou em mansões do Jardim Europa. Essa afronta entre pixadores e burguesia fica clara em seus processos vindos de condomínios residenciais. Há, porém, uma outra afronta ainda maior e tão polêmica quanto, entre quem pixa e quem grafita. Se há alguns anos havia uma confusão que unificava ambas as expressões, hoje o que fica é a certeza de que um é arte, o outro passa longe.
Uma das brigas mais recentes foi quando a Av. 23 de maio ganhou novas cores por meio de comissão da Prefeitura, que tem investido bastante na arte urbana. Mas o que Djan deixa claro é que a ascensão de uns é o declínio de outros. “O graffiti está sendo usado como um antídoto para a pixação. Existia um respeito mútuo (de não pixar em cima de graffitis), mas quando o poder público descobriu esse respeito, começou a usar isso para combater a pixação. Quando fizemos os atropelos nos murais foi para relembrá-los disso, causar uma reflexão. Quando o graffiti passa a ser privado, não somos obrigados a respeitar. O pixo não respeita nada que é privado“.
Provocador e polêmico, ele não se importa em falar abertamente o que pensa e, talvez por isso, optou pelo pixo como liberdade de expressão. Mas, por ironia do destino, as provocações se estendem e se inserem exatamente em sua mostra que, ao ocupar um espaço privado, é exatamente a invasão que ninguém queria ver. E se todo mundo amar o pixo um dia? “Aí acaba, porque o pixo não é feito para ser aceito”.
A parede de processos não artísticos, e sim jurídicos.
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Exposição “Em Nome do Pixo” @ Escritório de Arte Humanar | De 29.10 a 27.11
R. Brg. Galvão, 996 – Barra Funda, São Paulo – SP
Tel: (11) 3047 3047
Visitação: sábados e domingos das 11h30 às 18h30
Entrada franca
Todas as fotos © Brunella Nunes
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