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Os youtubers podem estimular sedentarismo e hábitos alimentares ruins para crianças?

13 • 04 • 2018 às 11:09 Kauê Vieira
Kauê Vieira   Sub-editor Nascido na periferia da zona sul de São Paulo, Kauê Vieira é jornalista desde que se conhece por gente. Apaixonado pela profissão, acumula 10 anos de carreira, com destaque para passagens pela área de cultura. Foi coordenador de comunicação do Projeto Afreaka, idealizou duas edições de um festival promovendo encontros entre Brasil e África contemporânea, além de ter participado da produção de um livro paradidático sobre o ensino de África nas Escolas. Acumula ainda duas passagens pelo Portal Terra. Por fim, ao lado de suas funções no Hypeness, ministra um curso sobre mídia e representatividade e outras coisinhas mais.

Há muito tempo a internet deixou de se destacar por ser um meio de conhecer novas pessoas e culturas. Desde sua popularização na última perna do século 20 muita coisa mudou e com a hecatombe das redes sociais, hoje a rede mundial de computadores se transformou em um espaço de monetarização e circulação de grandes quantias de dinheiro.

Capitaneada pelo Facebook, a intensificação da agilidade ganhou proporções nunca vistas, gerando uma descentralização completa da criação de conteúdo. Tempos atrás meia dúzia de veículos tratavam de formar a opinião das pessoas, porém as redes sociais acabaram com essa história, isso em função do número expressivo de usuários que criam contas, sejam elas no Instagram ou Twitter, para falar de inúmeros assuntos, apresentando uma visão diferente da tradicional.

Youtubers podem se tornar uma influência negativa para crianças

Entre as várias formas de se expressar, o vídeo foi eleito a mais popular, causando efeitos ainda mais sensíveis, como o crescimento do YouTube. Para se ter uma ideia, segundo números do YouTube Insights, a plataforma é acessada por 95% dos usuários de internet, sendo que entre pessoas de 18 a 35, os dados alcançam os 96%. Com isso, uma nova palavra passou a integrar o vocabulário. Quem nunca ouviu falar do termo youtuber? Como já dizia há muito tempo o músico Gil Scott-Heron, a “revolução não será televisionada”.  

Os youtubers nada mais são do que pessoas, geralmente jovens, que criam um canal no YouTube para falar do que der na telha. Talvez desconhecidos dos pais, figuras como Kéfera Buchmann, de 22 anos e Whindersson Nunes, 23, são ídolos de crianças, adolescentes e até adultos. Com um potencial de geração de lucro gigantesco, os youtubers falam para centenas de milhares de pessoas e em muitos momentos exercem uma influência nas crianças muito maior do que a dos pais.

Recentemente este poder foi colocado em xeque por uma mãe que percebeu uma alteração nos hábitos alimentares de seu filho. Em entrevista ao Hypeness,a editora Elis Monteiro, que escreveu um desabafo sobre o assunto, contou que o conteúdo produzido pelo youtuber Lucas Neto estava trazendo efeitos negativos para o desenvolvimento do garoto.

Whindersson Nunes tem 26,3 milhões de seguidores no YouTube

Segundo Elis, a cisma começou quando ao voltar de um show dele no Rio de Janeiro, o Netoland, ligou os pontos, percebendo assim o fundamento da suspeita com os vídeos do canal, com mais de 14 milhões de inscritos.

“Já reclamávamos muito dos gritos e das trolagens, mas ainda não tínhamos feito a conexão com o lance da comida. Como meu filho é muito ativo fora de casa (faz natação três vezes por semana e futebol três também), a gente deixava ele assistir youtube um pouco pela manhã, até para descansar. Depois do show, ele nunca mais assistiu aqui em casa e tem respeitado muito a nossa decisão”, explicou.

Diretamente ligado ao estilo de vida moderna, os casos de obesidade vem crescendo assustadoramente e atingindo em cheio as crianças. Recentemente a Organização Mundial da Saúde (OMS) fez um levantamento mostrando que o número de crianças obesas multiplicou por 10 no mundo todo só nos últimos quatro anos.

Para Ana Carolina Couto, bacharel em nutrição pela Universidade de Franca, os meios de comunicação são decisivos no sedentarismo e consequentemente no ganho de peso. Ana ressalta ainda que a desigualdade social é outro ponto importante, já que “alimentos como frutas, legumes, verduras e derivados de leite não estão presentes na alimentação cotidiana destas pessoas (mais pobres)”.

“Os meios de comunicação – principalmente a internet – possuem uma grande influência sobre as crianças, pois são espaços de fácil acesso e ínfima regulamentação e controle. As crianças muitas vezes passam a seguir pessoas tornando-as ídolos que, por sua vez, usam de vozes e atitudes infantilizadas para chegar mais perto do seu público, que é extremamente vulnerável, oferecendo uma infinidade de produtos e marcas que muitas das vezes não contribuem para um desenvolvimento saudável”, falou ao Hypeness.  

A nutricionista Ana Carolina Couto cobra uma postura mais responsável dos meios de comunicação

Gelatina gigante, quantidades excessivas de açúcar, consumo desenfreado de frituras e doces, estes são os grandes chamativos do canal de Lucas Neto. Armadilha infalível contra a maioria das crianças, certo?

Elis acredita que alguns youtubers fazem uso de uma espécie de ‘imaturidade caricata’ para passar valores vistos como prejudiciais. “Eles são adultos (agora, milionários) lucrando muito agindo como crianças de menos de 10 anos. E passando valores que eu, pessoalmente, não quero para o meu filho. Quero que o meu filho valorize o dinheiro, valorize os pais, entenda que comida não é brincadeira, que consumismo é errado,” ressalta.  

Agora, como permitir que as crianças estejam integradas com a modernidade sem colocá-las em risco? Grande desafio para as famílias, sejam elas como forem, a alternativa é sempre buscar o diálogo. Pelo menos é o que aponta Ana Carolina Couto, destacando ainda a eficácia da ajuda de um profissional da nutrição.

“O trabalho desenvolvido com as crianças reflete em ótimos resultados, já que elas possuem uma facilidade enorme de aprendizado que são, muitas vezes, perdidos no convívio familiar e na reprodução de hábitos alimentares nem sempre saudáveis”, aponta.

Como cantou Caetano Veloso, “é proibido proibir”, mas também não dá para ficar alheio ao que se passa nas tantas telas que crianças e adolescentes carregam pra lá e pra cá.

“Não sou ingênua a ponto de achar que podemos acompanhar TUDO que nossos filhos assistem porque eles têm escola, amigos, avós. Também não sou a favor de censura (nem para os youtubers). Mas os pais precisam estar atentos porque há muita coisa imprópria ali. Culto ao dinheiro e ao desperdício, assim como culto ao consumismo”, salienta Elis Monteiro.  

Como bem disseram as entrevistadas, o objetivo aqui não é demonizar, tampouco desqualificar o trabalho exercido por youtubers, pelo contrário. Pensando nisso, listamos algumas influencers super bacanas e que podem ajudar e muito no desenvolvimento de jovens e adultos.

Gabi de Pretas – Na casa dos 20 e poucos anos, esta jovem negra do Rio de Janeiro é uma ótima pedida para pais que desejam discutir conceitos de beleza, empoderamento negro. Mas não só isso, com sacadas engraçadas, Gabi Oliveira fala de tudo, séries, penteados bacanas e até de comidinhas.

Palavra Cantada – Para os mais novinhos, essa dupla é uma opção perfeita. Com letras lúdicas, o duo usa a música como maneira de se aproximar das crianças, incentivando o estudo, leitura e a prática esportiva.

Então RaquelEstrelado pela pequena Raquel, o canal ensina receitas que as crianças podem fazer com os pais, além de falar de assuntos como o relacionamento em casa.

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Fotos: foto 1: Pixabay/foto 2: Divulgação/foto 3: Divulgação/foto 4: Reprodução/YouTube/foto 5: Reprodução/YouTube/foto 6: Reprodução/YouTube


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