Diversidade

Projeto que educa homens por violência doméstica diminui reincidência para 2%

04 • 12 • 2019 às 17:50
Atualizada em 04 • 12 • 2019 às 18:29
Yuri Ferreira
Yuri Ferreira   Redator É jornalista paulistano e quase-cientista social. É formado pela Escola de Jornalismo da Énois e conclui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo. Já publicou em veículos como The Guardian, The Intercept, UOL, Vice, Carta e hoje atua como redator aqui no Hypeness desde o ano de 2019. Também atua como produtor cultural, estuda programação e tem três gatos.

No nosso país, o punitivismo tem crescido de maneira profunda como ideologia. A dificuldade de entender que a ressocialização e a educação são caminhos para reduzir a criminalidade é gritante, e muita gente desmerece a capacidade de pessoas que cometeram delitos de melhorarem.

Mas os dados mostram o contrário. Um dos casos mais interessantes é o do projeto ‘Tempo de Despertar’, programa promovido pelo Ministério Público Estadual de São Paulo que tem como foco a reeducação de homens que foram presos pela Lei Maria da Penha.

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Imagem de uma das reuniões do ‘Tempo de Despertar’

Através de reuniões que buscam falar sobre violência contra as mulheres, machismo e masculinidade tóxica, o projeto do MP que virou Lei Estadual se tornou referência para reduzir a reincidência de violência doméstica. Segundo dados do Núcleo de Combate à Violência Doméstica Contra a Mulher (Gevid) a reincidência pela Lei Maria da Penha passou de 65% para 2% entre 2014 e 2016, uma queda substancial.

O programa, que agora é a Lei 16.659/2018, está em prática desde a década passada, ganhou visibilidade e respeito, e tem um efeito drástico para educar homens que cometeram atos de violência doméstica. A idealizadora do projeto, a promotora Gabriela Manssur, explicou a motivação por trás do ‘Tempo de Despertar’.

Gabriela Manssur (ao centro) é a cabeça do projeto

“Houve uma dúvida: mesmo com vários projetos voltados para o empoderamento feminino e para o encorajamento das mulheres para romper o silêncio, medo e vergonha, os índices de violência não diminuíram. Por isso foi preciso buscar novas estratégias para prevenção e enfrentamento desse tipo de violência”, explicou ao site Justiça de Saia.

A promotora responsável pelo projeto é Gabriela Manssur. Ela participa das reuniões, feitas em diversos fóruns de São Paulo. Enquanto muitos homens sequer haviam ouvido falar de machismo, o ‘Tempo de Despertar’ coloca em pauta esse tema. Sérgio Barbosa, um dos idealizadores do projeto, explicou a relação entre masculinidade e violência.

“Muitos dos nossos comportamentos são estimulados para sermos fortes, viris, nunca aceitar a negativa de uma mulher ou de um homem, e sempre ter iniciativa. Muitas vezes, a violência é desencadeada quando o agressor encontra uma mulher forte, que demonstra sonhos e desejos. Ele acha que ela é posse”, afirmou Barbosa ao Catraca Livre.

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“A maior beneficiada pelo projeto ‘Tempo de Despertar’ é a mulher. A aproximação dos agressores com profissionais especializados que compõem a rede protetiva é indispensável para informá-los sobre a desigualdade de gênero, direitos das mulheres e os papéis que mulheres e homens desempenham atualmente na sociedade, numa tentativa de desconstrução do machismo”, afirmou Gabriela Manssur em comunicado oficial do MPSP.

Esse tipo de programa é essencial para a desconstrução do machismo na sociedade. No 5º país que mais comete feminicídios no mundo e que matou 106 mil mulheres entre 1980 e 2013 por questões de gênero, esse tipo de política é essencial para a segurança pública.

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“Uma tragédia nunca acontece de forma instantânea. São pequenos sinais e comportamentos que esses homens vão realizando diante da mulher, como vigiar o celular dela, persegui-la no trabalho, maltratá-la ou diminuí-la. São esses indícios que geralmente a sociedade não identifica como violência doméstica e que podem culminar num feminicídio”, concluiu Sérgio ao Catraca Livre.

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Fotos: Foto 1: Reprodução/MPSP Foto 2: Reprodução/MPSP Foto 3: © Getty Images


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