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A memória e os ensinamentos de Martin Luther King Jr. flutuam pelo tempo. Nascido há exatos 91 anos em Atlanta, capital da Geórgia, estado localizado no Sul dos Estados Unidos, famoso pela postura racista e segregadora, Luther King lutou a vida toda pela liberação dos negros norte-americanos.
E, podemos dizer com segurança, dos negros do mundo todo, sobretudo os da diáspora africana – descendentes de homens e mulheres arrancados de seus países de origem na África para subsidiar a formação das Américas. Falamos da escravidão, obviamente.
– Não, Luther King não foi um líder da conciliação, mas um revolucionário
Martin Luther King foi assassinado em Memphis, no Tennessee, aos 39 anos. O crime de ódio foi motivado pela recusa de brancos estadunidenses de abraçar e compreender a diversidade. O ódio contra o povo negro e, talvez, contra a mensagem erroneamente lida como conciliatória do ativista foram o combustível para que Luther King fosse assassinado a tiros em um hotel da cidade.
Martin Luther King foi decisivo para garantir o voto aos negros
O autor, James Earl Ray, confessou o crime, mas, anos depois, negou ter sido responsável pela perda precoce do ativista. A história é cercada de fraturas. E, tal como o assassinato de Malcolm X, rondada por teorias que apontam a participação do Estado, aqui sob a batuta do FBI, a polícia federal dos Estados Unidos – então comandada por J. Edgar Rover.
Fato é que Martin Luther King, antes de ser morto, se preparava para mais uma marcha pela liberação e dignidade do povo preto. Isso faz lembrar a histórica Marcha de Selma a Montgomery.
O evento aconteceu em um dos estados mais violentos contra pessoas negras e também berço de acontecimentos importantes para os afro-americanos. Foi em Birmingham, no mesmo Alabama, que Angela Davis nasceu e deu os primeiros passos até se tornar um dos maiores expoentes da luta por liberdade e em defesa da democracia.
– Por que a luta por democracia não existe sem Angela Davis
“Sempre disse que uma das minhas primeiras memórias de infância era o som de explosões de dinamite. Casas na rua onde nasci eram bombardeadas assim que se tornavam lar de pessoas negras. Tantas bombas atingiram o bairro onde cresci, que ele passou a se chamar ‘Colina da Dinamite’”, disse Davis sobre a infância no Alabama, em São Paulo, durante palestra com a presença do Hypeness.
Nascida no Alabama, Angela Davis sofreu com a segregação
A marcha que garantiu o voto aos negros dos EUA e contou com a participação decisiva de Martin Luther King Jr., nasce quase uma década antes, depois de Rosa Parks, em 1955, chamar a atenção do mundo. Ela se recusou a dar lugar para um homem branco em um ônibus em Montgomery. Parks foi presa, julgada e condenada pelo regime racista do século 20.
– ‘Olhos que Condenam’ nos sufoca ao mostrar como a Justiça desumaniza jovens negros
O caso provocou revolta da comunidade negra, que de passiva não tem nada, sendo o estopim para uma nova série de protestos contra o regime segregacionista no Sul do país. A luta pelos direitos civis ganhou novos capítulos, como o boicote ao transporte público de Montgomery.
Rosa Parks na parte da frende do ônibus em Montgomery
Parks foi presa por desafiar leis racistas do Sul dos EUA
Luther King discursou para aproximadamente 5 mil pessoas na frente da Igreja Batista Holt Street, em Montgomery, em 5 de dezembro de 1955, quatro dias depois da prisão de Rosa Parks.
“Estamos aqui esta noite para tratar de um assunto sério. Somos cidadãos norte-americanos e temos o direito de desfrutar da plenitude de nossa cidadania. Estamos aqui porque amamos a democracia e acreditamos profundamente que o regime democrático, quando colocado em prática, é a melhor forma de governo na Terra”, iniciou.
Rosa Parks foi uma das referências históricas para a liberdade negra
Mas, estamos aqui por um motivo específico, a situação dos ônibus de Montgomery. Estamos aqui pela determinação de mudar o cenário. O problema se arrasta por anos. Os negros de Montgomery e de outras áreas sofrem com o medo de andar de transporte público em nossa comunidade. Os negros foram intimidados e humilhados e oprimidos pelo simples fato de serem negros. Vocês sabem, meus amigos, que chega um tempo em que a pessoa cansa de ser oprimida. Há um tempo, meus amigos, que cansamos de ser humilhados e jogados para fora do alcance dos raios de sol da vida.
Os acontecimentos impulsionados não apenas pela coragem, mas pela negação de uma mulher negra de ser diminuída, resultaram na decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos de tornar ilegal a discriminação racial em transporte público.
Embora tenha sido uma vitória expressiva, na prática pouca coisa mudou. Os negros ainda eram vítimas de violência e conviviam em condições extremamente desiguais em comparação com os brancos. Era preciso, em pleno século 20, lutar pelo direito ao voto.
“Esta é Selma, Alabama. Existem mais negros na cadeia do que detentores do direito ao voto”, escreveu Luther King no The New York Times.
Martin Luther King e seu grupo entram em cena novamente. Desta vez, o ativista participaria de uma passeata pacífica de cerca de 85 quilômetros pela estrada entre Selma e Montgomery. Foram três tentativas ao todo.
Os passos iniciais pela democratização do voto foram dados pelo Movimento pelo Direito ao Voto de Selma, que diante da resistência branca resolveu pedir ajuda para Martin Luther King. Selma, então, recebeu lideranças pelos direitos civis de diversas partes do país, em janeiro de 1965.
Doctor King fala para 25 mil pessoas em Selma, Alabama
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A primeira marcha aconteceu em março de 1965, em protesto contra a morte de Jimmie Lee Jackson, ativista pela Lei dos Direitos ao Voto, assassinado por policiais durante marcha noturna em Marion, também no Alabama.
Deu tudo errado. Doctor King estava em Atlanta. O líder político havia conversado dois dias antes com o presidente Lyndon Johnson sobre o direito ao voto e planejava se unir aos manifestantes no dia seguinte. Ele, porém, não esperava que a violência se manifestasse com tanta força.
A repressão policial aumentou ainda mais no que ficou marcado como Domingo Sangrento. Cerca de 600 manifestantes protestavam contra a morte de Jackson quando foram alvos de uma emboscada e atacados pela polícia com cassetetes e gás lacrimogêneo.
Tudo começou quando os manifestantes cruzavam a ponte Edmund Pettus, construída sobre o Rio Alabama. As pessoas podiam ver bandeiras confederadas e o nome de Edmund Pettus, que além de batizar a construção, foi general e membro da Ku Klux Klan no Alabama.
Ku Klux Klan em ponte com nome de general confederado, Selma, Alabama
Fotografias da época mostram os protestantes diante de um grupo de policiais – todos com capacetes brancos e cassetetes. A violência reinou, mesmo que os manifestantes não tenham esboçado nenhuma reação.
Martin Luther King deixou Atlanta e rumou para Selma. Em 9 de março, ele liderou a marcha até uma igreja local. Isso aconteceu depois de um confronto na mesma ponte. Mas, em seguida, a polícia abriu espaço para que eles pudessem passar. Naquela noite, um grupo de pessoas brancas matou o ativista dos direitos civis James Reeb.
Mesmo combalido com uma notícia ruim atrás da outra e problemas familiares, Doctor King atuava nos bastidores para garantir o direito ao voto. Os momentos, aliás, foram retratados no filme ‘Selma’, dirigido pela cineasta Ava Duvernay. A produção indicada ao ‘Oscar’ mostra os bastidores das negociações, inclusive com Malcolm X se colocando à disposição para aplicar suas táticas violentas contra os brancos racistas.
“Ser passivo não significa ser condescendente. Quando você fala com as pessoas sobre King, elas se referem ao discurso ‘Eu Tenho um Sonho’, e que ele acreditava na paz e morreu. Sério? Ele foi reduzido a isto? E nós deixamos isso acontecesse. E se há algo que ‘Selma’ faz, é tornar a narrativa ao seu redor apropriada. Fiel aos seus planos”, disse Ava, diretora de ‘Selma’, à Rolling Stone.
As táticas de King se provaram eficazes e forçaram o Lyndon Johnson a fazer um pronunciamento em rede nacional no dia 13 de março. Ele anunciou a criação de uma lei para garantir aos afro-americanos o direito ao voto. Quatro dias depois, o juiz Frank Johnson derrubou veto do governador do Alabama, George Wallace, ordenando que a marcha fosse realizada.
Estima-se que 30 mil pessoas caminharam até Montgomery. Martin Luther King liderou a multidão ao lado de líderes religiosos e brancos que apoiavam a liberdade efetiva dos negros.
O direito ao voto se tornou lei em 6 de agosto de 1965. O evento ganhou ainda mais simbolismo décadas depois com a eleição de Barack Obama – primeiro presidente negro dos Estados Unidos.
– Em SP, Obama dá o recado, ‘se você não inclui negros e mulheres, está deixando talento para trás’
No aniversário de 50 anos da Marcha de Selma, Barack esteve na cidade ao lado da mulher, Michelle, do então membro da Câmara dos Representantes, John Lewis – falecido ao final de 2019 -, e Amelia Boynton Robinson – os dois foram agredidos pela polícia durante os protestos de 50 anos atrás.
O episódio evocou o legado de Martin Luther King ao patamar máximo, reconhecendo sua contribuição decisiva para o avanço da comunidade norte-americana. Não se engane, Doctor King não foi um pacifista condescendente, mas um líder que soube como ninguém concretizar os direitos e anseios da comunidade negra.
“Selma nos ensinou também que toda ação requer que nos livremos de nosso cinismo. Quando se trata da busca por justiça, não podemos admitir complacência ou desespero”, Barack Obama, em Selma, em 2015.
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