Ciência

Coronavírus: cientistas relatam ameaças de morte em disputa política da cloroquina

28 • 05 • 2020 às 15:24
Atualizada em 28 • 05 • 2020 às 15:32
Yuri Ferreira
Yuri Ferreira   Redator É jornalista paulistano e quase-cientista social. É formado pela Escola de Jornalismo da Énois e conclui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo. Já publicou em veículos como The Guardian, The Intercept, UOL, Vice, Carta e hoje atua como redator aqui no Hypeness desde o ano de 2019. Também atua como produtor cultural, estuda programação e tem três gatos.

O Brasil passa por um momento sombrio. Um cientista brasileiro que comandou um estudo que indicou a ineficácia da cloroquina contra o coronavírus sofreu ameaças de morte por suas descobertas. As informações são El País. Sua pesquisa no Amazonas mostrou que havia poucos indícios de que a substância trazia melhoras para pacientes em casos graves foi reforçada pela OMS, cerca de um mês depois.

O dr.  Marcus Lacerda, médico infectologista e pesquisador e especialista em Saúde Pública do Instituto Leônidas e Maria Deane (Fiocruz Amazônia), relatou como sua vida foi afetada pela politização da cloroquina, defendida por figuras como Jair Bolsonaro, mesmo após comprovação de sua ineficácia para conter casos de covid-19.

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Infectologista foi ameaçado por fazer estudo que indicou que a cloroquina não era eficiente contra o novo coronavírus

“A primeira frustração foi saber que a cloroquina não funcionava; a segunda, descobrir que as pessoas interpretavam o julgamento como um ataque a Bolsonaro”. Comecei a receber ameaças de morte, me diziam que eu ia perder meus filhos, que iria acabar como Marielle Franco (a vereadora assassinada em 2018 no Rio de Janeiro)”, contou Lacerda ao El País Brasil.

O estudo do infectologista da Fiocruz Amazônia era claro: “No contexto de pacientes graves de covid-19, nosso estudo acende um sinal vermelho para o uso de altas dosagens de cloroquina, porque os riscos de efeitos tóxicos superam os benefícios”. Um mês depois, um estudo feito pelo The Lancet com 96 mil pacientes mostrou que cloroquina e, em especial, a hidroxicloroquina aumentam a taxa de mortalidade do novo coronavírus.

Na Espanha, 1 a cada 5 pessoas hospitalizadas com casos graves de coronavírus morreram. A cloroquina foi ministrada em 85% dos casos. 23% das pessoas tratadas com antibióticos e cloroquina nos estudos do The Lancet morreram, enquanto a taxa de mortalidade em não-medicados era de 6%. Os números não contribuem para os discursos que defendem a droga.

Na semana passada, o Presidente Jair Bolsonaro, aumentou a polarização em cima do tratamento, afirmando que “quem era de direita, tomava cloroquina e quem era de esquerda, tomava tubaína”. A politização de uma medicamento pode ser bastante complicada. Mesmo com a comprovação científica dos efeitos negativos da cloroquina para a covid-19, o Governo Federal manteve o protocolo de ministrar a substância para todos os casos da doença.

O Comitê Científico do Consórcio Nordeste, liderado por Miguel Nicolelis, reiterou que a cloroquina não deve ser usada em nenhuma fase do tratamento. “Estudos clínicos em múltiplos países demonstram, categoricamente, a inexistência de qualquer efeito terapêutico destes medicamentos e o gravíssimo risco de morte súbita por parada cardíaca irreversível. Seguindo recomendações do NIH, o Comitê reafirma que só devem haver exceções para possíveis estudos clínicos randomizados que sigam todos os procedimentos dos comitês de ética locais.”, afirma

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