Ficou difícil de enxergar a participação de Emicida no ‘Domingão do Faustão‘ desta semana porque o rapper estava coberto de razão. Brincadeiras à parte, a participação virtual do filho de dona Jacira não teve nenhuma piada e foi cirúrgica no que diz respeito a temas importantes como racismo, feminismo, coronavírus e violência doméstica.
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Adepto do isolamento social, Emicida dá entrevista por videochamada para o Faustão
“Lembro dos primeiros anos da minha vida, a gente morava em um cortiço”, contou ele sobre a infância na casa da mãe. “Tinha uma casa que era colada na nossa, parede com parede. E lá o marido agredia a mulher dia após dia. Esse foi inclusive o motivo pelo qual a minha mãe decidiu se mudar dali. Estou falando aqui sobre os anos 1980, mas a gente não pode agir como se isso não fizesse parte da realidade do país nos dias de hoje”, alertou.
Emicida aproveitou a fala para chamar atenção sobre aspectos da quarentena atrelados ao tema. “Neste momento em que estamos reclusos em casa, muitas mulheres estão trancadas com seus agressores”, disse.
A morte de George Floyd e os protestos contra a discriminação racial, que começaram nos Estados Unidos e tomaram todo o mundo, também não foram ignorados pelo rapper. Emicida pontuou que o imaginário coletivo do brasileiro foi induzido a acreditar que o país vive uma democracia racial, em que brancos e pretos são tratados de forma igual, com oportunidades iguais, quando, no dia a dia, prevalece o racismo estrutural, ignorado por boa parte da população.
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“Estamos aqui falando uma semana após uma mulher em Pernambuco abandonar uma criança no elevador e essa criança cair do nono andar e falecer”, falou, em referência à morte do menino Miguel Otávio, de cinco anos, filho de Mirtes Renata Santana de Souza. A mulher trabalhava na casa de Sari Corte Real e Sérgio Hacker, prefeito do município de Tamandaré, no litoral do estado, e viu seu filho morrer após ser deixado sozinho em um elevador pela patroa.

Faustão e Emicida no “Domingão” do último dia 14
“A gente precisa sim se perguntar por que uma pessoa em pleno gozo de sua faculdade mental abandona uma criança de cinco anos dentro de um elevador”, indagou o rapper, que ainda lembrou do caso do menino João Pedro, morto a tiros pela polícia dentro de sua casa, no Rio de Janeiro.
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Para Emicida, as mudanças necessárias para uma real transformação da sociedade não estão em nada associadas à pandemia do coronavírus.
O que é extremamente letal são os abismos sociais que a nossa sociedade produziu e finge que não existem.
“Esse é o filho da dona Jacira, que sempre incentivou esse cara a ler, a importância da educação, e é por isso que ele, com tudo contra, conseguiu superar os preconceitos e os obstáculos e seguiu o caminho da dignidade”, elogiou Faustão. A entrevista completa pode ser vista no Globoplay.