Debate

Guarda humilhado por carteirada de desembargador diz que não consegue dormir

20 • 07 • 2020 às 11:55
Atualizada em 20 • 07 • 2020 às 12:10
Redação Hypeness
Redação Hypeness Acreditamos no poder da INSPIRAÇÃO. Uma boa fotografia, uma grande história, uma mega iniciativa ou mesmo uma pequena invenção. Todas elas podem transformar o seu jeito de enxergar o mundo.

Ao ser abordado por não usar máscara em uma praia de Santos, no litoral de São Paulo, o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, deu um exemplo de como não agir com outros profissionais, especialmente em tempos de pandemia. Indignado com a advertência, ele humilhou o guarda municipal Cícero Hilário, chamando-o de ‘analfabeto’, ‘guardinha’ e dizendo que ele estava ‘afinando’ ao insistir com a aplicação da multa.

O guarda municipal que realizou a abordagem do desembargador falou sobre o ocorrido ao G1, neste domingo (19). Ele afirma que atua há nove anos como GCM e que muitas pessoas se mostram resistentes em utilizar a máscara de forma correta. “Agora com a pandemia, muitas pessoas ainda insistem em andar sem máscara ou a utilizam de forma errada. Tanto que, nesse mesmo dia, fizemos 12 atuações referentes ao uso da máscara. Tivemos algumas situações que teve falta de respeito, mas não como a desse senhor [desembargador]“. 

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Siqueira também é ex-coordenador da Secretaria da Área de Saúde (SAS) do TJ-SP. Durante toda a abordagem, as imagens mostram que o guarda orienta Eduardo sobre a importância do uso da máscara, medida preventiva para evitar a transmissão da Covid-19. O caso ocorreu na tarde deste sábado (18), quando a equipe da GCM o abordou para orientá-lo sobre o uso obrigatório de máscara na cidade, definido por meio de decreto municipal.

De acordo com Hilário, ele e o companheiro de trabalho primeiro sinalizaram de longe a Siqueira avisando que ele precisava colocar o acessório, mas ele respondeu que não colocaria. “Por isso fomos até ele para prestar orientação”, diz. 

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Foi durante a abordagem que o guarda foi ofendido pelo magistrado. “[O pior] foi ser chamado de analfabeto, quando ele perguntou se eu sabia ler e quando disse que jogaria a autuação na minha cara. A gente não espera uma atitude dessa de um senhor com a formação que ele tem”, disse Hilário ao G1. 

“Estávamos fazendo nosso trabalho pelo bem da população. Acho que usar máscara nessa situação que vivemos é uma demonstração de amor ao próximo”, relatou. De acordo com Hilário, os filhos viram o vídeo publicado pelo G1 e perguntaram porque ele foi tratado daquela forma. A família ter visto que ele passou por aquela situação o deixou bastante chateado.

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Apesar do ocorrido, Hilário relata que sabe que cumpriu seu papel e que a profissão de GCM é muito importante para ele. Ter orgulho de ter cumprido a função também foi o que ajudou o colega Roberto Guilhermino, que o acompanhava na ocorrência e autor das imagens, a superar a situação.

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Desembargador: ‘Decreto não é lei’

Após a reposta do guarda, o desembargador ameaça jogar a multa, caso seja feita, no rosto do agente municipal. “Você quer que eu jogue na sua cara? Faz aí, que eu amasso e jogo na sua cara”, diz Siqueira.

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Em nota, o desembargador Eduardo Siqueira diz que o vídeo é verdadeiro, mas alega que foi tirado de contexto. Para ele, a determinação por decreto do uso de máscaras em determinados locais é um abuso.

No texto divulgado, Siqueira explica que “decreto não é lei” e que, por isso, entende não ser obrigado a usar máscara, e que qualquer norma que diga o contrário é “absolutamente inconstitucional”. Ele alega que esse não foi o primeiro incidente que aconteceu entre ele e agentes da Guarda Civil Municipal, e que em todas as ocasiões foi ameaçado de prisão de modo agressivo, justificando a exaltação.

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Essa não foi a primeira vez que Eduardo Siqueira agiu dessa forma. Um outro vídeo obtido pela reportagem do G1, mostrou que, em junho, ele já havia desrespeitado e ameaçado um inspetor da GCM, ao ser flagrado também descumprindo o decreto municipal que obriga o uso de máscaras na cidade.

Após a repercussão dos vídeos publicados pelo G1, o Tribunal de Justiça de São Paulo divulgou uma nota afirmando que, ao tomar conhecimento, determinou imediata instauração de procedimento de apuração dos fatos e requisitou a gravação original e ouvirá, com a máxima brevidade, os guardas civis e o magistrado.

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A Prefeitura de Santos afirmou estar prestando total apoio à equipe que fez a abordagem e ressaltou que a multa foi lavrada. A Associação dos Guardas Civis Municipais, por meio do diretor Rodrigo Coutinho, afirmou repudiar o ocorrido e que tomará as medidas judiciais cabíveis.

‘Engenheiro civil formado. Melhor do que você’

Um caso parecido, que aconteceu no Rio de Janeiro, chamou atenção do Brasil e provocou a demissão dos envolvidos. Em um flagra exibido pelo ‘Fantástico’, um fiscal da Vigilância Sanitária do Rio de Janeiro é atacado por dois clientes de um bar na cidade, enquanto fazia a fiscalização do estabelecimento.

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O casal proferiu frases como “A gente paga você, filho. O seu salário sai do meu bolso” e “Cidadão, não. Engenheiro civil, formado. Melhor do que você”. As suposições do casal sobre o fiscal Flávio Graça foi baseada na função dele e em ideais pessoais de sucesso – e todas estavam erradas. A começar pelo grau de instrução do fiscal, que tem um vasto currículo profissional e na vida acadêmica. Veterinário, Flávio tem mestrado e doutorado pela Universidade Federal Rural do Rio (UFRRJ) e é pesquisador na área de sanidade animal.

No dia seguinte da exibição da reportagem na Rede Globo, Nivea Valle foi demitida da Taesa, local onde trabalhava como especialista de planejamento e controle desde janeiro deste ano. Na quarta-feira (8), a empresa onde Leonardo Santos Neves de Barros prestava serviço resolveu desligá-lo. O casal afirma que foi condenado pelas empresas onde trabalhavam sem o amplo direito de defesa.

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Em entrevista ao jornal O Globo, o casal afirmou não ter se arrependido da postura contra o fiscal, mesmo diante das consequências: “Arrependimento não é uma palavra que eu usaria. Eu diria que o meu tom de voz pode ter sido alterado, mas eu continuo achando que não é uma questão de estar certo ou não. Estávamos usando do nosso direito de questionar o trabalho daquele servidor. Eu posso questionar qualquer servidor público ou quem está nos atendendo. Ele estava trabalhando para a gente e temos o direito de questioná-lo”, disse Nivea Valle.

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Foto: Reprodução / Twitter


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