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Quando dei por mim — de fato, quando deixei a chupeta e tive tamanho para me lembrar de qualquer coisa da infância — os Secos & Molhados já não existiam. O que me consolava é que gente mais velha do que eu, com idade para ter comprado os discos e ido aos shows, tampouco teve muito tempo para entender o que estava acontecendo. Entre o hype nos teatros de São Paulo e a implosão no auge do sucesso não deu um ano. Um pouco mais do que os Mamonas Assassinas nos anos 1990, menos até do que o RPM nos 1980, foi o outro caso de sucesso fenomenal do pop brasileiro que brilhou como uma estrela cadente.
Mas a história dos Secos & Molhados, passados quase 50 anos, continuava envolta em mistério, em memórias descontextualizadas, em mal-entendidos. Lacônicos no palco, mitômanos nas entrevistas, ressentidos depois de separados… Não importa se você estava entre os 20 mil fãs no Maracanãzinho em 1974 ou se você só descobriu a banda nas reedições em vinil dos anos 2010, o trabalho feito pelo jornalista Miguel de Almeida no livro “Primavera nos Dentes: A História dos Secos & Molhados” (Editora Três Estrelas) vai ser revelador para você.
Biografia ajuda a esclarecer pela primeira vez a nebulosa história dos Secos & Molhados
Em parte, porque revela como, apesar de estarem totalmente adequados ao pós-tropicalismo de Raul Seixas e Novos Baianos, os Secos & Molhados foram uma experiência completamente à parte na história do rock, do pop e da música brasileira. Um ambicioso imigrante português fissurado em folk-rock, teatro e literatura, um jovem estudante de arquitetura e, bem, Ney Matogrosso — não eram os amigos de colégio que aprenderam a tocar e cresceram juntos todos-por-um e montaram uma banda por causa da amizade. Era um projeto construído para funcionar peça a peça, como a maior parte das bandas que amamos do exterior. Como foi o RPM, anos depois — e como o RPM carregou o vírus da desagregação desde o início.
É importante o longo trabalho de contextualização histórica feito por Miguel de Almeida no livro. Por ter uma história tão fugaz, boa parte das 340 páginas de “Primavera nos Dentes” se ocupa em reconstruir a cena musical brasileira de sua época, a história pessoal de cada integrante, a mídia dos anos 1970, detalhes dos ensaios e gravações. É um dos livros que de fato mais nos leva para dentro do ovo da serpente. O esgarçamento do grupo, sua separação e as histórias mal resolvidas são angustiosamente detalhadas. Há, claro o mistério que prevaleceu em torno da banda, mas há muito empenho no trabalho de Almeida.
Especialmente no terço final do livro, onde, o autor avisa, “a partir de agora haverá sempre duas versões da história, às vezes três”. É incrível como uma banda tão bem documentada tenha preservado tanta contrainformação sobre si. Diz muito sobre a limitada imprensa cultural brasileira.
Mas, ao mesmo tempo que era dissociada do rock brasileiro, e da MPB, e de qualquer coisa, os Secos & Molhados foram fruto legítimo de sua época. Crosby, Stills & Nash, Bowie, T-Rex, “moda andrógina”, Edy Star, Caetano e Gil, rock pauleira, ditadura – sobre esta, é um pouco surpreendente que nunca tenha me ocorrido que a estratégia de musicar poemas clássicos fosse um drible na censura.
Os Secos & Molhados foram um dos quatro ou cinco melhores grupos de rock da história do Brasil – embora não tenham composto “Balada do Louco”, alguém por favor avise o Carlinhos Brown. “Primavera nos Dentes” ajuda a mapear seus erros e acertos para as futuras gerações como parecia difícil fazer até então. Que suas lições sejam colocadas em prática por mais e mais bandas do rock brasileiro dos anos 2020.
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