Poeta, dramaturgo, ensaísta, crítico de cultura, militante da causa negra: o paulista Luiz Silva, mais conhecido como Cuti, é um dos maiores intelectuais brasileiros, um dos criadores dos Cadernos Negros e destaque entre as lideranças negras na militância político-cultural e no meio literário. Referência no debate dos conceitos de “Literatura afro-brasileira” e “afrodescendente”, o escritor é autor de obras como Quem tem medo da palavra negro e Literatura negro-brasileira (de ensaios), assim como Negros em contos e Quizila (de contos), e, entre muitas outras, Poemaryprosa, Negroesia e Flash crioulo sobre o sangue e o sonho (na poesia).

O poeta, dramaturgo, autor e professor Cuti © Antonio Terra/divulgação
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Sua assinatura está em sua vasta obra, mas também na criação do jornal de literatura Jornegro, e principalmente dos Cadernos Negros, uma das mais importantes e longevas série de antologias literárias do país.
Os Cadernos Negros
Criados em 1978 e publicado ininterruptamente desde então em formato anual, os Cadernos tornaram-se um marco na valorização e disseminação da literatura brasileira produzida por afrodescendentes – honrando assim a luminosa história de luta de nomes como Machado de Assis, Cruz e Souza, Lima Barreto, Auta de Souza, Luís Gama, Solano Trindade, Carolina Maria de Jesus – e do próprio Cuti. A primeira edição contou com os autores Henrique Cunha Jr., Angela Lopes Galvão, Eduardo de Oliveira, Hugo Ferreira, Celinha, Jamu Minka, Oswaldo de Camargo e Cuti.

O primeiro volume dos Cadernos Negros, lançado em 1978 © reprodução
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Reunindo contos e poemas, o impacto dos Cadernos é medido não só na régua do estudos literários propriamente, mas também pela fomentação da cultura e da produção artística das periferias. A antologia é hoje realizada pela ONG Quilombhoje Literatura, coletivo cultural e editora em São Paulo, também fundada por Cuti.
A literatura como instrumento de luta
Outra linha de atuação importante na trajetória de Cuti é o resgate da memória do movimento negro, e boa parte de sua atuação tem como foco o papel da literatura em cada página do processo discriminatório brasileiro – e da luta contra o racismo e o preconceito.

Lançamento do primeiro volume dos Cadernos, na livraria Teixeira, centro de São Paulo, em 1978
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“A luta entre escravizados e escravizadores mudou sua roupagem no biombo do século XIX para o século XX, mas prossegue com suas escaramuças, porque a ideologia de hierarquia das raças continua”, escreveu, em Literatura negro-brasileira. “Com a democracia jurídica, o esforço para alterar as mentalidades encontrou grande apoio, porém as noções cristalizadas de superioridade racial mantêm-se renitentes, e os argumentos de exclusão racista persistem para impedir a partilha do poder em um país étnica e racialmente plural. E a literatura é poder, poder de convencimento, de alimentar o imaginário, fonte inspiradora do pensamento e da ação”.

Desde 1978 a antologia foi lançada anual e ininterruptamente: o volume 42 foi lançado no ano passado © divulgação
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Com 21 livros autorais publicados entre os tantos gêneros supracitados e uma atuação fundamental no universo dos estudos literários e sociais, Cuti é também coautor em 5 livros 1 CD de poemas, além de assinar textos em antologias nacionais e internacionais diversas. Dentre as 43 edições dos Cadernos Negros ele só deixou de participar de uma, em 1994, e a relevância da antologia se amplia à luz da qualidade de seus autores e da importância do movimento negro em suas variadas frentes.

O último livro de Cuti, “Axéconchego – em face do fuzuê”, foi lançado no final do ano passado © divulgação