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Nessa semana, o mundo parou para observar o Talibã tomar o controle de Cabul, capital do Afeganistão, após os EUA retirarem suas tropas do país conhecido por seu estado constante de guerra. Mas o que é o Talibã? Por que a volta do grupo ao poder é tão temida? E o que isso significa para o desenho das relações internacionais?
Após 20 anos em uma operação militar no Afeganistão, os EUA confirmam seu fracasso em operações no Oriente Médio. Se por um lado, Joe Biden está sendo criticado por conta dos efeitos da retirada das tropas estadunidenses do país, por outro, não existe um fim diferente para essa história. O caos é tamanho no país que pessoas estão tentando fugir do país agarradas à lataria de aviões militares dos EUA:
MUNDO: Em Cabul, multidões tentam embarcar em aviões para deixar o Afeganistão, agora dominado pelo Talibã.
Imagens como essa ficam para a história. Parte triste da história.
— Renan Brites Peixoto (@RenanPeixoto_) August 16, 2021
Nesse texto, iremos explicar o que é o Talibã e o que justificam essas imagens:
Militantes do Talibã no Afeganistão durante a Guerra Civil dos anos 1990
O Talibã é um grupo militar islâmico da etnia pachto. Para entender o que é pachto, precisamos olhar rapidamente a demografia do território afegão: segundo estimativas da Biblioteca do Congresso dos EUA, 42% da população do Afeganistão é da etnia pachto – em especial na fronteira com o Paquistão -, 27% é de origem tajique – especialmente na fronteira com o Tajiquistão – e o resto se divide entre porções de uzbeques, hakaras, amaquies, túrquicos e baloches. Portanto, o que define o Talibã é a sua proximidade com a maior religião do país, o Islã, e a maior etnia do país, os pachtos.
Por esse motivo, o Talibã não é uma organização como o Estado Islâmico, o Boko Haram, a Al-Qaeda ou outros movimentos extremistas islâmicos, porque ele não tem caráter expansionista; o Talibã se limite ao Paquistão e ao Afeganistão, onde os pachtos habitam.
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O Talibã chegou ao poder durante a ‘Guerra Civil Afegã’, um conflito armado que perdurou entre 1992 e 1996, após o fim do governo socialista no país. Eles tomaram o poder em 1996 e governaram o país até 2001, quando os EUA invadiram o território afegão sob a lógica da ‘Guerra Ao Terror’.
Entre 2001 e 2021, o Talibã agiu na lógica de guerrilha contra a ocupação estadunidense. Com a saída dos EUA do país, o Talibã conseguiu articular contra o fraquíssimo governo de Cabul e retomou o poder no país sem qualquer tipo de resistência. Agora, a comunidade internacional olha com medo para a ascensão do grupo ao poder porque, durante seu período controlando o país durante os anos 1990, a situação do país era extremamente difícil.
“Pode não ser da mesma forma nem na mesma intensidade, mas não vai mudar. O regime repressivo, extremamente autoritário em relação aos afegãos de maneira geral e às mulheres em particular. Não vai haver diferença”, explica Reginaldo Nasser, professor de Relações Internacionais da PUC-SP, à RfI.
Ideologia do Talibã é uma amálgama entre questões étnicas, religiosas e políticas; retomada do poder pelos pashtuns mostra fracasso da lógica de guerra dos EUA
A ideologia do Talibã é uma mistura entre o islamismo Deobandi, uma vertente do islamismo sunita e o Pashtunwali, uma série códigos morais da sociedade pachto. O islamismo Deobandi é uma filosofia religiosa política, fundada por teóricos islâmicos indianos, que afirmam que a lei islâmica deve ser a lei do estado. De muitas formas, o pensamento Deobandi é similar ao wahabbismo – ideologia religiosa e política predominante na Arábia Saudita.
O Pashtunwali é uma série de preceitos que guiam a ética da sociedade pachto; essas ideias são pré-islâmicas, originadas provavelmente na época da Báctrea, antes da ideia de um estado afegão. Resumidamente, os três princípios do Pashtunwali são a Melmastyā́, Nənawā́te e Nyāw aw Badál, que são, respectivamente, a hospitalidade, o direito ao refúgio e a validade da vingança e da Justiça.
O princípio da hospitalidade, inclusive, pode ser visto na reportagem da CNN em Cabul. Entre gritos de ‘Morte aos EUA’ e ‘Alá é o Deus Supremo’, a jornalista americana Clarissa Ward disse que eles são bastante ‘amigáveis’:
“They’re chanting ‘Death to America’ but they seem friendly”?
We’re literally living in an episode of South Park.
— NUFF (@nuffsaidny) August 16, 2021
O problema é que a lógica islâmica do Islã defendida pelo Talibã é baseada, especialmente, na redução dos direitos das mulheres: em breve, o governo tornará obrigatória o uso da burca, proibirá mulheres de estudar e o terror será instaurado dentro do país.
Um dos casos mais conhecidos de vítimas do Talibã é o de Malala Yousafzai, que lutava pelo direito à educação no Paquistão em uma região dominada pelo Talibã. Os terroristas atiraram na cabeça da jovem que tinha apenas 13 anos de idade enquanto ela ia para a escola. Ela sobreviveu e se refugiou no Reino Unido, onde vive para denunciar o mal do talibã e da ideologia Deobandi.
Ela comentou a tomada de Cabul nas redes sociais. “Assistimos em completo choque enquanto o Talibã assume o controle do Afeganistão. Estou profundamente preocupada com mulheres, minorias e defensores dos direitos humanos. Poderes globais, regionais e locais devem pedir um cessar-fogo imediato, fornecer ajuda humanitária urgente e proteger refugiados e civis”, escreveu a ativista.
Afeganistão já foi estado laico onde mulheres eram livres. Tudo mudou após a ascensão do Talibã ao poder
O Afeganistão vive um cenário de caos social e político há décadas. Mas se precisarmos definir exatamente o que ocorreu no país, podemos remontar ao ano de 1978. O país vivia há cinco anos sob um regime republicano oriundo de um golpe militar. O governo apertou a repressão contra o Partido Popular, alinhado com o socialismo, e uma revolução socialista se iniciou no país.
– Série de fotos mostra um Afeganistão livre e colorido antes do Estado religioso e autoritário
Entretanto, sempre foi difícil conquistar a integralidade do Afeganistão: o país é cortado pro uma cordilheira e possui muitas comunidades étnicas diferentes, o que torna absolutamente complexa a instauração de um governo unitário, estável e contínuo. Os socialistas não alcançaram esse posto e pediram ajuda para a União Soviética, que enviou tropas para o país. A ‘Guerra do Afeganistão’ durou dez anos e os russos perderam feio, sendo conhecido como o ‘Vietnã Soviético’ – uma guerra longa, sem sentido e muito custosa.
Mas a principal pedra no sapato dos socialistas eram os Mujahideen, militantes islâmicos que lutavam contra o governo ateu no Afeganistão. Os Mujahideen foram treinados e financiados pela coalizão EUA-Paquistão. Lembrem-se: estamos na Guerra Fria. Entre os financiados estavam Mohammed Omar, fundador e principal líder espiritual do Talibã, e Osama bin Laden, fundador da Al-Qaeda e responsável pelos atentados de 11 de setembro. Resumidamente, os EUA criaram o Talibã para lutar contra os soviéticos, mas o tiro saiu pela culatra.
Após a queda do governo socialista, o país entrou em uma Guerra Civil e a força mais preponderante era a dos Talibãs oriundos da guerra contra os soviéticos. Em 1996, eles tomaram poder.
George W. Bush iniciou guerra contra o Talibã para lutar contra Al-Qaeda; vitória do grupo pode recolocar a lógica da Guerra ao Terror no debate público internacional
A principal base de operação da Al Qaeda e boa parte de seu treinamento ocorria no país. Após os atentados de 11 de setembro, o governo de George W. Bush tomou a iniciativa de lutar ‘contra a Al Qaeda’ e encontrar Osama bin Laden dentro do território afegão. Os EUA defendiam que o Talibã era o financiador do terrorismo contra os EUA.
Anos depois, os EUA foram incapazes de acabar com o Talibã e mesmo com a Al-Qaeda. Desmantelaram Cabul. Gastaram 2 trilhões de dólares em 20 anos de ocupação. Foram mais de 73 mil mortos entre resistentes afegãos contra o Talibã e soldados estadunidenses. E tudo isso para nada.
“Está claro que a estratégia dos americanos não deu certo. Mas isso não quer dizer que vá trazer grandes problemas para os Estados Unidos. De modo cínico, os Estados Unidos abandonaram o Afeganistão e o deixaram no caos. O que isso trará de consequência para os Estados Unidos em princípio? Nada”, completa Reginaldo Nasser.
– EUA gastou em 20 anos de guerra o suficiente para eliminar a fome e o aquecimento global
O Afeganistão se soma à Síria, ao Iraque e à Líbia como territórios que passaram por intervenções militares americanas nos últimos anos. Em nenhuma delas os EUA conseguiram estabelecer um regime seguro e estável. No Afeganistão e na Síria, os opositores dos EUA ganharam. Na Líbia e no Iraque, o EUA derrotou seus algozes e deixou o país desestabilizado e sem governo.
Agora, China e Rússia caminham para abrir um diálogo e reconhecer o governo do Talibã, tentando expandir sua influência na Ásia Central e ganhar mais uma peça dentro do complexo xadrez das relações internacionais.
“A humilhação talvez seja o triste fim de duas décadas de tragédia. Agora, fica claro que Washington deveria rever seu papel e evitar guerras a qualquer custo no futuro”, afirma Marwan Bishara, analista de relações internacionais da Al-Jazeera.
Agora, resta saber se o Talibã continuará no poder e de que forma a população afegã irá lidar com o seu novo governo. Pela primeira vez desde 1979, cessam as guerras no Afeganistão. Mas por quanto tempo?
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