Diversidade

Orgulho lésbico: pautas, reivindicações e liberdade de viver plenamente a sexualidade

30 • 08 • 2021 às 14:48 Gabryella Garcia
Gabryella Garcia Gabryella Garcia é paulista, mulher trans, transfeminista e jornalista pela Unesp. Começou a carreira escrevendo horóscopos para o João Bidu e agora foca em escrever sobre direitos humanos e recortes de gênero. Já passou por veículos de São Paulo, Santa Catarina, Espírito Santo e também colaborou para veículos como Ponte Jornalismo, Congresso em Foco e Elle Brasil. Atualmente, além de produzir o podcast "Prosa", para o Hypeness, também colabora com o UOL. Além disso atua como voluntário no Projeto Transpor, um projeto que oferece consultoria profissional gratuita para pessoas transgêneros com montagem de um currículo assertivo, Linkedin e simulação de entrevistas de emprego.

Agosto é considerado o mês da visibilidade lésbica no Brasil e há duas datas comemorativas que deram origem ao mês de reconhecimento da existência de pessoas lésbicas e visibilidade para suas pautas. O dia 19 de agosto é o Dia do Orgulho Lésbico e em em 29 de agosto é celebrado o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. Mas, apesar de datas que chamam a atenção para as demandas dessas pessoas, o cotidiano de pessoas lésbicas no Brasil, sejam mulheres cisgêneras e transgêneras ou pessoas não binárias, ainda é repleto de violência. Durante muitos anos a militância LGBTQIA+ focou seu ativismo em homens gays, deixando em segundo plano e invisibilizando as demais letras. Para nos ajudar a entender a realidade, dificuldades e também a satisfação de viver plenamente sua sexualidade, o ‘Prosa’ convidou a mestra em sociologia e especialista em gênero e sexualidade, Letícia Lanz, a advogada e mestra em direitos e garantias fundamentais, Renata Bravo, e ê pesquisadore e ativista, Ale Mujica Rodriguez, para um debate.

O Dia do Orgulho Lésbico, comemorado em 19 de agosto, remete ao ano de 1983, quando aconteceu a primeira grande manifestação de mulheres lésbicas no Brasil, em um bar de São Paulo. A manifestação ficou conhecida como o “Stonewall brasileiro”, quando ativistas do Grupo Ação Lésbica Feminista se reuniram para protestar contra os abusos e preconceitos que vivenciavam no local chamado Ferros’s Bar. O bar era um ponto onde ativistas LGBTs e artistas podiam fazer performances e trabalhar, um mês antes do protesto, entretanto, os donos haviam vetado a distribuição da primeira publicação lésbica do Brasil, chamada “ChanacomChana”.

Já no ano de 1996, em 29 de agosto, ativistas de todo o Brasil se reuniram no Rio de Janeiro para organizar o primeiro Seminário Nacional de Lésbicas. Desde então, a data marca o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica.

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Durante muitos anos a militância LGBTQIA+ focou seu ativismo em homens gays, deixando em segundo plano lésbicas e suas pautas e reivindicações

Para Letícia Lanz, vivendo em uma sociedade estruturada no machismo e totalmente heteropatriarcal, descobrir e aceitar sua identidade e sua sexualidade eram vistos como erros, ainda mais 60 anos atrás. “Descobri que tinha coisa ‘errada’ quando tinha 8 ou 9 anos. Ao mesmo tempo não me identificava no mundo masculino, me identificava no feminino e queria ficar com meninas. Isso há 60 anos era visto como uma perversidade muito grande e eu não tinha com quem conversar a respeito, era uma solidão muito grande, foi uma viagem muito solitária. Eu tive que descobrir ao longo da minha vida e sair da visão patologizada de que eu era imoral, decadente e perversa”.

Já a advogada Renata Bravo, contou que foi se percebendo no tempos de escola, por volta dos 15 anos de idade. Ela conta que sempre teve suas amigas mas, em dado momento, entendeu que não era apenas amizade e tinha algum sentimento a mais. “Eu nunca tive dúvidas, tive um relacionamento ótimo com meus pais e também tinha algumas referências de novelas e a própria Cássia Eller, além de muitas amigas que já tinham se descoberto“.

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Ale Mujica, por outro lado, destacou que ao contrário de muitas pessoas, seu choque foi quando descobriu que o mundo não era ‘viado’. “Na minha família minha avó cuidava de mim e tinha muitas reuniões com amigas e elas dançavam entre elas. Para mim o mundo era esse, com mulheres dançando, convivendo e falando mal de homens. Os companheiros dessas mulheres nunca apareciam então o cenário era esse, até que me deparei com outro mundo na adolescência e vi que os afetos não eram assim. Eu sentia afeto mais intenso por mulheres e tentava dar nome para meus afetos, a lesbianidade faz parte da minha história e da construção do desejo”.

Representatividade

A questão da representatividade é extremamente importante para que as pessoas tenham referências e possam se enxergar como parte de algum grupo ou movimento, a representatividade faz parte de um processo de reconhecimento, aceitação e normalização. Ale Mujica, entretanto, afirma ser muito complexo pensar e definir a representatividade, destacando a dificuldade de se definir algo que é extremamente plural e diverso.

Letícia também pontuou que os movimentos, inclusive os lésbicos são muito pouco representativos, uma vez que todos os movimentos, de uma forma geral, defendem aquilo que é considerado absoluto ou da maioria. “Os movimentos precisariam ser muito mais plurais porque dizem defender a diversidade, mas querem conceitos absolutos. A tentativa de imposição de rótulos me fez afastar de todos os movimentos e eu permaneci à margem”.

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Pessoas lésbicas constantemente são vítimas de objetificação e fetichização

Lesbocídio

A lesbofobia é um termo que difere da homofobia pois, além do preconceito sofrido pela orientação sexual, essas pessoas são vítimas do machismo. Essa violência se torna ainda mais acentuada quando falamos de mulheres negras, trans ou pessoas não binárias. Da mesma forma, o lesbocídio também difere do feminicídio ou do homicídio. Em 2018 pesquisadoras da UFRJ lançaram o Dossiê do Lésbocídio, que busca categorizar e levantar dados específicos dos assassinatos de mulheres lésbicas.

Para a advogada Renata Bravo, é extremamente importante que se faça recorte e dê diferentes nomes para que o problema passe realmente a ser enxergado pela sociedade. “A violencia é muito maior quando é homicídio de mulher lésbica ou trans do que mulheres cis, é fundamental falar de transfeminicídio e de lesbocídio. Dizem que já existe lei para todo mundo e o código penal já pune mas não, mulheres cis são mortas por uma razão, as mulheres trans por uma razão e mais uma, as mulheres lésbicas por uma razão e uma outra. É importante dar recorte dos nomes e leis porque as formas de praticar violências são muito mais cruéis quando praticadas com mulheres trans e mulheres lésbicas”.

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Ale também destacou que é triste pensar que são necessárias mortes em massa, com um recorte específico, para que seja possível a reivindicação de políticas públicas voltadas para determinados recortes da sociedade. Letícia Lanz, por sua vez, reforçou a importância de se fazer um recorte específico e também chamou a atenção para o fato de mulheres lésbicas serem assassinadas por despertarem certa repulsa de parte da sociedade por romperem com um poder patriarcal e cisheteronormativo. “É importante fazer críticas ao poder e temos também que denunciar os moldes em que esse poder é construído”, finalizou.

O episódio também abordou questões como identitarismo, representatividade, rótulos, papéis sociais das mulheres, associação errônea de mulheres lésbicas com masculinidades e muito mais!

Ficou curioso para saber o que mais rolou nessa prosa? Então aperta o play, sinta-se em casa e vem com a gente! Ah, também guardamos dicas culturais incríveis para você nesse episódio enquanto aprecia um café com um pão quentinho!

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