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Mais de 200 jornalistas que trabalham para a Folha de São Paulo endereçaram uma carta de repúdio à diretoria do periódico por conta do espaço dado pelo jornal a artigos negacionistas do racismo no Brasil, como o escrito por Antonio Risério e textos do passado publicados por Demétrio Magnoli e Leandro Narloch.
André Risério publicou texto que fomenta relativização do racismo no Brasil
No texto considerado racista de Antonio Risério, o antropólogo destaca casos isolados de crimes de grupos negros nos EUA para justificar a existência de algum tipo de racismo reverso. Demétrio, por sua vez, nega que o processo escravagista no Brasil tenha sido motivado a partir de questões raciais e que, por sua vez, exista uma dívida histórica entre brancos e negros no Brasil, ignorando o fato de que é a estrutura racista que permeia a sociedade brasileira.
No ano passado, a Folha também havia dado espaço para Leandro Narloch tecer comentários que reforçam ideais negacionistas sobre o período histórico da escravidão no Brasil, uma das mais longevas do mundo.
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A reação negativa e até indignada de intelectuais, políticos e jornalistas fez com que funcionários da redação da Folha de São Paulo escrevessem uma crítica à permissividade do jornal em publicar textos tentando buscar uma certa isonomia entre o racismo sofrido por negros, um fato, e a crença falaciosa da existência de uma espécie de racismo reverso, de pretos contra brancos.
Os jornalistas afirmam que a publicação têm aberto e incentivado ideias que negam a dinâmica estrutural do racismo no Brasil em busca de cliques.
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Sede da Folha de São Paulo; jornalistas se posicionam contra política editorial do jornal
“Em mais de uma ocasião recente, a Folha publicou artigos de opinião ou colunas que, amparados em falácias e distorções, negam ou relativizam o caráter estrutural do racismo na sociedade brasileira. Esses textos incendeiam de imediato as redes sociais, entrando para a lista de mais lidos no site. A seguir, réplicas e tréplicas surgem, multiplicando a audiência. A controvérsia então se estanca e morre, até que um novo episódio semelhante surja”, diz a carta.
De fato, 10 artigos de opinião contrários à coluna de Risério foram publicados até então, mas nenhum ganhou repercussão tamanha a ponto de ultrapassar o texto negacionista do sociólogo.
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“O racismo é um fato concreto da realidade brasileira, e a Folha contribui para a sua manutenção ao dar espaço e credibilidade a discursos que minimizam sua importância. Dessa forma, vai na contramão de esforços importantes para enfrentar o racismo institucional dentro do próprio jornal, como o programa de treinamento exclusivo para negros”, complementam os jornalistas.
A empresa afirma que promove a pluralidade, mas até a reformulação de seu conselho editorial, que é citada como positiva na nota emitida pela Folha para se defender de seus próprios funcionários, se mostra problemática. Dos doze membros do Conselho Editorial do jornal, apenas dois eram negros em sua formulação.
Isso porque a filósofa Sueli Carneiro abandonou seu posto após a publicação da coluna de Leandro Narloch em que o mesmo provoca e satiriza o movimento negro.
“A saída de Sueli Carneiro ocorre dias depois de o jornal publicar um artigo do colunista Leandro Narloch, em que ele relativiza a escravidão de mulheres negras, em texto intitulado ‘Luxo e riqueza das sinhás pretas precisam inspirar o movimento negro’”, disse o Notícia Preta naquele 7 de outubro de 2021.
Sueli Carneiro abandonou órgão da Folha de São Paulo após jornal ser permissivo com artigo racista no ano passado
O único negro restante no Conselho Editorial da Folha é o advogado Thiago Amparo, que criticou duramente o jornal em sua coluna:
Leia o @thiamparo, sempre. pic.twitter.com/hbvLar8G1X
— Mariana Belmont (@marianabelmont) January 20, 2022
A Folha se defende atacando os jornalistas e os acusando de erro na nota, que seria uma acusação sem fundamento.
“O abaixo-assinado erra, é parcial e faz acusações sem fundamento, três características indesejáveis em se tratando de profissionais do jornalismo. Erra ao sugerir que a Folha publicou artigos que relativizam ou fazem apologia do racismo, o que não aconteceu, até porque racismo é crime. É parcial ao omitir iniciativas que têm sido a prioridade do jornal nos últimos três anos. Acusa sem fundamento ao creditar a publicação de opiniões divergentes, que são a base do jornalismo defendido pelo jornal, a uma pretensa busca por audiência –os textos mencionados tiveram cerca de 1% da audiência total dos dias em que foram publicados”, afirma Sérgio Dávila, diretor de Redação.
A carta foi duramente criticada nas redes sociais:
Ameaça clarissima a jornalistas que assinaram a carta contra a publicação de conteúdo racista pela empresa.
— Cecília Olliveira (@Cecillia) January 20, 2022
Mais cedo, durante a tarde de ontem, vi tweets declarando apoio aos jornalistas que assinaram a carta aberta sobre racismo na Folha. Não entendi. Afinal as vítimas das ofensas eram os negros… agora que vi a resposta do jornal ficou claro que esses jornalistas estão em perigo.
— Serge Katz (@sk_serge) January 20, 2022
A @folha usa os princípios jornalísticos quando convém.
Se o jornalismo deve se apegar ao fato e às constatações científicas, e aí se inclui as ciências sociais, nada é mais antijornalismo do que dar espaço para teorias malucas de racismo reverso.
— Pedro Borges (@pedroborgesf) January 20, 2022
Racismo não pode ser normalizado, nem escravidão. Não existe racismo reverso, assim como o Holocausto não é questão de opinião e que o negacionismo emperra o enfrentamento da pandemia, além de ceifar vidas.
Por isso tudo e mais, toda a solidariedade aos colegas da Folha.— Marcelo Lins (@MarceloLins68) January 19, 2022
A defesa da direção da Folha cai na mesma ladainha bolsonarista que defende a cloroquina, na mesma ladainha trumpista que defende a supremacia branca, na mesma ladainha antivacina que lota os hospitais da Europa e dos EUA, na mesma ladainha neonazi que defenda a negação do Holocausto: uma suposta liberdade de expressão.
Esse trunfo comum do iluminismo – “discordo do que você diz, mas defenderei até a morte seu direito de dizê-lo” – se mostra ultrapassado. Hoje em dia, essa ideia para um fórum de internet anônimo, mas infelizmente estamos falando de um dos jornais mais lidos do país, que deve ter responsabilidade com o conteúdo que publica e deve considerar com esmero quem contrata como colunista.
Receber críticas à sua política editorial não é censura ou cancelamento. Censura era aquilo que a Ditadura Militar de 1964 fazia contra os jornalistas brasileiros (e nunca contra os donos do jornal). Aliás, vale lembrar que a Folha de São Paulo apoiou a ditadura. Quem lembra?
A estrutura racista da sociedade brasileira é inegável quando falamos em termos de ciências sociais. Não estamos tratando de uma questão discutível como OVNIs, quem deve ser o camisa 10 da seleção ou o próximo eliminado do “BBB”.
Estamos falando sobre racismo, cacete. Estamos falando de uma estrutura que mata milhares de jovens negros todos os anos, que mantém pessoas em situação análoga à escravidão em pleno século 21, que tem tantos sintomas que não são possíveis de colocar em um parágrafo, em um texto ou em um só livro.
A Folha é livre para publicar o que diabos ela quiser, afinal, é protegida pela Constituição Federal. Assim como o Hypeness. Mas essa defesa irrevogável de uma liberdade de expressão que favorece a violência não parece a de um jornal a serviço da democracia. Muito pelo contrário.
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