Arte

Mavo: o movimento que radicalizou a arte japonesa dos anos 1920 com performance, erotismo e revolução

18 • 02 • 2022 às 15:52
Atualizada em 22 • 02 • 2022 às 10:11
Vitor Paiva
Vitor Paiva   Redator Vitor Paiva é jornalista, escritor, pesquisador e músico. Nascido no Rio de Janeiro, é Doutor em Literatura, Cultura e Contemporaneidade pela PUC-Rio. Trabalhou em diversas publicações desde o início dos anos 2000, escrevendo especialmente sobre música, literatura, contracultura e história da arte.

A aproximação do centenário da Semana de Arte Moderna no Brasil nos lembra o quanto os anos 1920 foram efervescentes, e de forma alguma não somente no Theatro Municipal de São Paulo: em todo o mundo, vanguardas radicais, experimentais e revolucionárias se lançavam ao desafio de atualizar o repertório estético e, assim, ético de seus países – e no Japão não foi diferente. Se o ocidente preguiçosamente costuma pensar na arte japonesa, especialmente supondo cenários anteriores aos anos 1960, remetendo às mais domesticadas tradições, é porque desconhece o que foi o movimento Mavo, grupo modernista-dadaísta fundado em 1923 para combater o conservadorismo do cenário artístico japonês de então, e reposicionar o país na direção dos pontos mais importantes dos debates da época.

Duas performances do Mavo, registrada no início dos anos 1920

Duas performances do Mavo, registrada no início dos anos 1920

-Sada Yacco: artista que trouxe o teatro kabuki para o ocidente foi vendida aos 4 anos

Liderado pelo artista, autor e dramaturgo Tomoyoshi Murayama, o grupo trouxe o cerne da crise enfrentada no período, com o desenvolvimento industrial e os avanços da modernização, para a produção artística, através de um caminho interdisciplinar que reunia performance, pintura, design, ilustração e arquitetura sob o mesmo ímpeto de combater o establishment burguês. Tal qual fizeram os modernismos em todo o mundo, o Mavo procurava derrubar as fronteiras entre a vida cotidiana e a arte, utilizando agressividade, erotismo, teatralização e provocação em performances para provocar as normas e a moralidade do público japonês, através de exposições movidas pelo espírito de guerrilha e aproximadas do que viriam a ser os happenings, algumas décadas depois.

Tomoyoshi Murayama

Tomoyoshi Murayama, líder do movimento, utilizava a androginia como expressão artística

-Fluxus, grupo do qual fez parte Yoko Ono que desafiou nos anos 1960 os parâmetros da arte

O contexto imediatamente posterior ao fim da Primeira Guerra Mundial, que acelerou os primeiros passos do processo de globalização e industrialização que marcaria o século XX, era o alvo geral do grupo, fundado através de uma retomada da Associação de Arte Futurista, que havia sido encerrada no país, somado a compromissos comunistas e revolucionários, como combustíveis de suas atuações. Durante uma performance de 1923, o artista Takamizawa Michinao atirou pedras contra o teto de vidro de uma galeria enquanto os quadros eram exibidos na rua, do lado de fora do espaço. A dança, o teatro e a fotografia eram também formas importantes de expressão para Murayama, que se valia de uma aparência andrógina e utilizava a nudez como força de suas apresentações e fotografias.

Capas da revista Mavo

Capas da revista Mavo

-Os Incoerentes: movimento que em 1882 antecipou as mais importantes tendências do século 20

Além das performances, das pinturas, colagens e exposições, o movimento é reconhecido e celebrado pelo pioneirismo da Mavo Magazine, uma revista que circulou sete edições, entre julho de 1924 e agosto de 1925, trazendo ensaios, poemas, textos teatrais e ficções como forma de ampliar os debates socioculturais e os propósitos revolucionários do coletivo. Diagramada com colagens e reproduções de obras dos membros do movimento – que, além dos já citados, incluía artistas como o ilustrador Tatsuo Okada e o artista visual Masamu Yanase, entre outros ilustradores, autores, poetas e atores –, a publicação traz fortes influências do futurismo russo, e deixou claro seu propósito ao trazer em uma das edições uma bombinha recheada de pólvora como metafórico “brinde”.

"Construction" [Construção], trabalho de Tomoyoshi Murayama, de 1925

“Construction” [Construção], trabalho de Tomoyoshi Murayama, de 1925

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© fotos: Wikimedia Commons/reprodução

 

 


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