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De acordo com Sociedade Brasileira de Pediatria, o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) se manifesta quatro vezes mais no gênero masculino do que no feminino. A maioria dos estudos na área é realizada com meninos, preferencialmente durante a infância mesmo. Como consequência, grande parte do conhecimento produzido é sobre homens no espectro, em detrimento das mulheres, que costumam sofrer um apagamento, sendo, inclusive, menos diagnosticadas.
Mulheres autistas? Sim, elas existem e têm a negligência neuroatípica como realidade. Muitas delas estão tentando mudar a forma como são invisibilizadas dentro do espectro ao pontuar que o maior número de homens diagnosticados é explicado pelo padrão de diagnóstico, que se baseia apenas nas particularidades que eles apresentam. Esse é o caso da poetisa e escritora carioca Milena Martins Moura.
Milena Martins Moura é escritora e se autodiagnosticou autista quando já era adulta.
Mestre em Literatura Brasileira pela UERJ e editora da revista cassandra, ela se autodiagnosticou autista leve quando já era adulta. O reconhecimento tardio de sua condição é muito comum entre as mulheres e mais uma consequência da negligência neuroatípica enfrentada por elas. Além dos estudos sobre o tema se concentrarem em como o transtorno afeta os homens, o autismo se manifesta de maneira relativamente diferente no gênero feminino. Assim, ele costuma ser descartado pelos especialistas, o que dificulta o diagnóstico.
“Mulheres são costumeiramente mais cobradas por um amadurecimento precoce. Dessa forma, mulheres autistas podem aprender, desde muito cedo, ferramentas para mascarar suas características”, explica Milena. Diante da exigência de seguir padrões cognitivo-comportamentais, é comum que mulheres no espectro moldem suas atitudes e repliquem as de outras pessoas para se camuflarem. Esses mecanismos são chamados de masking (“mascarar”) e mirroring (“espelhar”).
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Durante momentos de socialização, Milena explica que a maioria das mulheres autistas tende a reproduzir frases prontas para fugir de possíveis situações constrangedoras, evitar suas estereotipias (comportamentos verbais ou motores repetitivos) e imitar trejeitos e expressões de terceiros. “Isso em nenhum momento anula suas crises, sua sobrecarga sensorial, seus stims, entre outras manifestações possíveis do espectro autista no sujeito”, pontua a escritora. Mesmo assim, muitas desconhecem o próprio autismo.
“Eu sempre soube haver algo diferente em mim, nunca conseguindo, porém, saber como ser mais ‘normal’”, diz Milena.
Tendo aprendido a ler e a escrever muito cedo, Milena era uma aluna de alto desempenho, inclusive na parte artística. Ao mesmo tempo, sempre teve dificuldades para socializar e se comunicar, o que atrapalhava sua compreensão de mundo e da linguagem corporal. “Eu sempre soube haver algo diferente em mim, nunca conseguindo, porém, saber como ser mais ‘normal’ e, por isso, cresci com uma autoimagem errônea e uma autoestima muito prejudicada”, conta a carioca, que viveu uma infância e adolescência solitárias.
Após pesquisar sobre o autismo em mulheres e se autodiagnosticar, Milena foi em busca do laudo de um especialista. Mas o que encontrou foi mais uma forma de negligência, dessa vez travestida de capacitismo médico. Em uma das consultas, o profissional mentiu para ela sobre os sintomas do TEA, em outra, a medicou em menos de dois minutos. “Também passei por uma consulta de apenas cinco minutos dos quais não consegui falar mais do que a metade do tempo, e que terminou compulsoriamente porque o especialista se recusava a me deixar contestá-lo.”
Os relatos de Milena não são os únicos sobre violência médica contra mulheres no espectro. É por esse motivo que a comunidade autista apoia e aceita o autodiagnóstico. “Ninguém merece se manter oculto e em silêncio por circunstâncias que dizem mais sobre a formação médica, o sistema de saúde e o neurocapacitismo estrutural do que sobre sua condição (…). Não ter o laudo não faz de mim nem um milímetro menos autista”, desabafa.
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O mercado de trabalho tende a dificultar a pela inclusão de pessoas autistas, sobretudo mulheres que nunca conseguiram um laudo médico de sua condição.
Mas se esse é um fato pouco entendido por familiares e pessoas próximas dessas mulheres, é ainda pior para o mercado de trabalho. Sem poder comprovar sua condição formalmente, muitas delas ficam ainda mais expostas a situações neurocapacitistas nos empregos. “A pessoa autista começa a ser balizada por padrões improcedentes, vista como egoísta, antipática ou ‘esquisitona’”, exemplifica Milena. Mulheres no espectro estão sujeitas a piadas, isolamento e tratamento agressivo ou infantilizado por parte do chefe e dos colegas de trabalho.
Autistas leves, que utilizam as ferramentas de masking e mirroring, ainda podem ser “consideradas normais demais para uma vaga PCD ou para conseguir um benefício”, destaca a escritora. Nesse caso, suas necessidades especiais, tidas como invisíveis, também não são atendidas pelo mercado. O ambiente de trabalho então se torna cada vez menos acolhedor, obrigando essas mulheres a deixarem seus empregos ou fazendo com que elas sofram psicologicamente.
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Milena também enfrentou diversas dificuldades por ser uma mulher autista no mercado de trabalho e, hoje, é escritora. “A Orquestra dos Inocentes Condenados”, seu terceiro livro, acaba de ser lançado e aborda os efeitos que sentimentos como luto, saudade e solidão causaram durante a pandemia de Covid-19. Além de refletir sobre a fragilidade da vida, a obra também discute a questão da neurodiversidade entre mulheres.
Capa do livro “A Orquestra dos Inocentes Condenados”.
“Eu tenho constantemente falado sobre o espectro autista em mulheres justamente para que meninas como eu não passem pelo que passei. Existir sem plena consciência de si é doloroso e solitário e nenhuma criança deveria passar por tamanha carga capacitista nos seus momentos de maior fragilidade e ainda em tempo de formação”, declara Milena.
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