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Copa do Mundo: as maiores teorias da conspiração da história dos mundiais de futebol

28 • 10 • 2022 às 16:12
Atualizada em 31 • 10 • 2022 às 17:45
Vitor Paiva
Vitor Paiva   Redator Vitor Paiva é jornalista, escritor, pesquisador e músico. Nascido no Rio de Janeiro, é Doutor em Literatura, Cultura e Contemporaneidade pela PUC-Rio. Trabalhou em diversas publicações desde o início dos anos 2000, escrevendo especialmente sobre música, literatura, contracultura e história da arte.

A Copa do Mundo de futebol é o evento esportivo mais assistido e celebrado do mundo, com uma audiência tão grande que supera em dobro a dos Jogos Olímpicos. Trata-se, portanto, de uma competição séria, que coloca as maiores seleções do mundo em disputa justa pela taça dourada – ou é isso que a FIFA quer que o público acredite. Pois é claro que um evento dessa grandeza – e que começou no distante ano de 1930 – carrega uma coleção de teorias da conspiração ao longo de seus quase 100 anos de história.

As teorias da conspiração são tão populares quanto as próprias histórias das Copas

As teorias da conspiração são tão populares quanto as próprias histórias das Copas

-6 momentos históricos em que a Copa do Mundo foi muito mais que futebol

Justamente por se tratar do esporte mais popular do mundo, o futebol e a Copa movem paixões e forças culturais, econômicas e mesmo políticas imensas. É dessa importância que nascem as teorias, alimentando especulações e explicações – ou delírios – dos conspiratórios de plantão. Ainda que algumas teses tenham sido comprovadas ou explicadas com o passar dos anos, a maioria das especulações parece mero escape para a imponderável dor da derrota – ou serão elas a mais pura (e secreta) verdade?

Selecionamos algumas das mais célebres e debatidas teorias por trás de momentos misteriosos dos Mundiais. Com a aproximação da Copa do Qatar de 2022, é certo que a lista abaixo crescerá, e novos capítulos serão adicionados a essa longa história de paixão, competição – e conspiração.

Mussolini e a Copa de 34

As teorias começam já na segunda Copa do Mundo, ocorrida na Itália em 1934, durante o governo fascista de Benito Mussolini. O ditador de extrema-direita viu no Mundial uma oportunidade de celebrar o espírito nacionalista italiano – e, reza a lenda, não mediu esforços para garantir o título, com direito a ameaças e vastos investimentos secretos.

Capa de jornal celebrando a vitória dos "atletas fascistas" na presença de Mussolini em 1934

Capa de jornal celebrando a vitória dos ‘atletas fascistas’ na presença de Mussolini, em 1934

Além de jurar a morte de seus próprios jogadores caso perdessem a Copa, Mussolini teria selecionado e subornado árbitros, explicando assim apitos suspeitos em favor do país-sede em diversas partidas. Ao fim, depois de o Uruguai ganhar a primeira Copa, em 30, a Itália se sagraria a segunda campeã mundial de futebol, em 1934, e confirmaria o bicampeonato em 1938 – ainda durante o período fascista.

Garrincha na final de 62

Com Pelé machucado desde a primeira fase, o peso da tarefa de conquistar o bicampeonato brasileiro, em 1962, caiu inteiramente sobre Garrincha – e o ponta-direita do Botafogo realizou um torneio de gênio. Na semifinal contra o Chile, Mané fez história, com gol de fora da área, gol de cabeça, passes preciosos, dribles inalcançáveis, mas também um pontapé no chileno Rojas, que lhe garantiu um cartão vermelho. Com a suspensão causada pela expulsão, o Brasil iria para a final sem Pelé e sem Garrincha, o principal jogador da Copa.

A seleção brasileira que se sagrou bicampeã em 1962: Garrincha é o primeiro agachado à esquerda

A Seleção Brasileira que se sagrou bicampeã, em 1962: Garrincha é o primeiro agachado à esquerda

-Há 60 anos, Brasil superava ‘viralatismo’ para vencer 1ª Copa com futebol arte

Antes da final, porém, dirigentes brasileiros alegaram que o juiz não havia relatado a agressão na súmula do jogo. No julgamento de Garrincha, o bandeirinha, que seria testemunha, desapareceu. Mané acabou absolvido, jogou a final e o Brasil conquistou seu segundo título, por 3 a 1, na decisão contra a Tchecoslováquia. Anos depois, o árbitro brasileiro Olten Ayres de Abreu, que trabalhou na Copa, afirmou que uma mala com 15 mil dólares fez o bandeira “desaparecer” e garantiu Garrincha na final.

O gol fantasma da Inglaterra em 66

Trata-se de um dos lances mais controversos da história do futebol: a final da Copa de 1966 foi para a prorrogação empatada em 2 a 2, em um jogo duro e disputado entre a anfitriã Inglaterra e a Alemanha. Aos 11 minutos do primeiro tempo da prorrogação, o inglês Geoff Hurst recebeu a bola na área e bateu com força, o chute explodiu no travessão, a bola quicou no chão, aparentemente sobre a linha do gol, e foi afastada pelo zagueiro. O bandeirinha azeri Tofiq Bahramov e o juiz suíço Gottfried Dienst, porém, concluíram que a bola entrou, confirmando o terceiro gol inglês na final.

O momento em que a misteriosa bola quica na linha - ou dentro do gol? - na final de 1966

O momento em que a misteriosa bola quica na linha – ou dentro do gol? – na final de 1966

O jogo acabaria 4 a 2 para a seleção inglesa, mas a disputa em verdade nunca terminou. Nas fotos e vídeos, alguns ângulos mostram a bola quicando claramente dentro do gol, enquanto outros registros não deixam dúvidas de que a bola caiu sobre a linha, e que o gol teria sido, portanto, irregular.

O lance mudou o destino da partida e, desde então, os teóricos de plantão afirmam que o juiz recebeu prêmios e pagamentos das mãos da própria rainha – até hoje, não há conclusão inequívoca sobre se a bola, afinal, entrou ou não: assista ao lance aqui e chegue à sua própria conclusão.

A ditadura argentina na Copa de 78

Se a controvérsia em 1966 se deu por um lance, na Copa de 1978 a polêmica marcou o mundial como um todo. Realizada na Argentina durante a sangrenta ditadura do general Jorge Rafael Videla, a competição teria sido utilizada para abafar os horrores no país e vender ao mundo uma imagem positiva sobre a Argentina do período.

Vencer, portanto, era determinante para que essa estratégia internacional desse certo – e um regulamento alterado e confuso, com uma partida inacreditável, garantiram a Argentina na final e eliminaram o Brasil, mesmo a seleção canarinho não tendo perdido um único jogo.

O ditador Jorge Rafael Videla entregando o troféu para a seleção argentina na Copa de 1978

O ditador Jorge Rafael Videla entregando o troféu para a seleção argentina na Copa de 1978

Após a fase de grupos, a Copa era novamente dividida em grupos e, nessa etapa, para roubar a vaga do Brasil a Argentina precisava vencer o Peru por 4 gols de diferença – e a partida terminou em um milagroso 6 a 0. O jogo começou com duas horas de atraso, após o término da partida do Brasil, Videla visitou o vestiário peruano antes e depois da partida. Mais um detalhe: o goleiro do Peru, Ramón Quiroca, era naturalizado peruano, mas nascido na Argentina. Ao fim, o Brasil foi eliminado invicto, a Argentina – que perdeu um jogo – se sagrou campeã e as comemorações encobriram os protestos contra o regime nas ruas de Buenos Aires.

 A água batizada do Brasil em 90

Em mais uma teoria envolvendo a Argentina, essa é uma das conspirações que, com o tempo, se confirmou: em 2004, o próprio Maradona detalhou, em entrevista, sobre quando o lateral brasileiro Branco foi intoxicado na partida contra a Argentina, ao tomar uma água “batizada” durante a disputa pelas oitavas de final da Copa de 1990. O calor era inclemente em Turim, e Branco aceitou a garrafa das mãos dos auxiliares argentinos no meio da partida.

Maradona com a camisa da seleção brasileira celebrando a vitória na Copa de 1990

Maradona com a camisa da Seleção Brasileira celebrando a vitória na Copa de 1990

-Como Maradona ajudou Napoli na luta contra a discriminação na Itália

De acordo com Maradona, a água de uma das garrafas continha o tranquilizante psiquiátrico Rohypnol, e o desempenho do brasileiro foi afetado a partir do gole. A Argentina aproveitou a oportunidade para dominar o jogo, Maradona enfileirou os brasileiros e colocou Caniggia na cara do gol de Taffarel para marcar o gol que eliminou o Brasil. A Argentina viria a perder a final da Copa de 1990 para a Alemanha.

EUA e a FIFA contra Maradona em 94

O corte de Maradona por dopping da Copa de 1994 é até hoje uma ferida aberta no coração da torcida argentina, e o próprio craque reiterou até o fim que foi vítima de um complô. O genial argentino havia sido pego com cocaína em 1991. Reza a lenda que o governo dos EUA não queria vê-lo campeão em solo norte-americano: ao fim do jogo contra a Nigéria, Maradona foi sorteado e, diante do resultado positivo, barrado do Mundial.

O fato de Maradona ter ido sorridente e tranquilo para o exame ampliou a suspeita em 1994

O fato de Maradona ter ido sorridente e tranquilo para o exame ampliou a suspeita em 1994

A teoria não para por aí e sugere que João Havelange, brasileiro que então presidia a FIFA, teria participado da trama, pois queria ver o Brasil campeão ainda durante sua gestão e precisava tirar Maradona do caminho – e o tetra brasileiro veio contra a Itália na final. Apesar de existirem livros e documentários denunciando o “complô”, muitos registros sugerem que Maradona de fato tomou remédios para emagrecer para estar em forma durante o torneio.

Nike e a FIFA na derrota de 98

A final da Copa de 1998 entre Brasil e França começou horas antes de o juiz iniciar propriamente a partida, e não terminou com o apito final, já que até hoje são intensos os debates sobre o que aconteceu naquele dia 12 de julho, na França. A história diz que o atacante Ronaldo teve uma convulsão antes do jogo, mas se recuperou e acabou escalado pelo técnico Zagallo. A atuação do jogador e de quase toda a equipe foi apagada e o Brasil terminou vice-campeão após sofrer um 3 a 0 retumbante da anfitriã.

A cena de Ronaldo caminhando após a derrota com as chuteiras da Nike tornou-se emblema da conspiração

A cena de Ronaldo após a derrota com as chuteiras da Nike tornou-se emblema da conspiração

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O misterioso incidente com Ronaldo, porém, alimentou os teóricos, que suspeitam do envolvimento da Nike, patrocinadora do atacante. Algumas teses dizem que um esquema envolvendo a empresa, a CBF e a FIFA garantiu que o título ficasse com os donos da casa, enquanto outros conspiratórios afirmam que a gigante do material esportivo teria obrigado o técnico a escalar o jogador, mesmo sem condições. O mais provável, porém, parece ser mesmo o difícil de aceitar: o Brasil jogou mal, a França jogou melhor e terminou campeã.

7 x 1 em troca do ouro olímpico

O Estádio do Mineirão, em Belo Horizonte, foi cenário de uma das maiores derrotas da história do esporte, na semifinal da Copa de 2014, quando o Brasil foi eliminado pela Alemanha pelo emblemático placar de 7 a 1. Assim, ao mesmo tempo que um resultado tão elástico pode parecer impossível de ocorrer sem uma explicação extraordinária, esse é um dos casos mais fáceis de se compreender a busca por uma conspiração para justificar tamanha tragédia esportiva. Como seria possível, em condições normais, que o Brasil sofresse um revés tão grande em sua própria casa, afinal?

Os jogadores da Alemanha celebrando o terceiro dos sete gols que fariam contra o Brasil em 2014

Os jogadores da Alemanha celebrando o terceiro dos sete gols que fariam contra o Brasil em 2014

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E assim começou o trabalho dos teóricos da conspiração, que acusam diversas farsas por trás do vexame do dia 8 de julho de 2014. A teoria começa com a lesão de Neymar no jogo anterior, contra a Colômbia, que seria encenada, e sugere que, por trás, estaria um acordo entre a FIFA, CBF, Alemanha, o Comitê Olímpico Internacional e até a Rede Globo, vendendo a semifinal da Copa em troca da medalha de ouro, até então inédita, que viria para o Brasil no Rio, em 2016, em uma final jogada justamente contra a Alemanha. Será?

Para refrescar a memória: a final da Olimpíada terminou nos pênaltis, após 1 a 1 no tempo normal, com a vitória do Brasil por 5 a 4 sobre a Alemanha. A derradeira cobrança – que valeu o ouro – foi de Neymar. 

A bela e cobiçada taça da Copa do Mundo, que motiva as mais variadas teorias da conspiração

A bela e cobiçada taça da Copa do Mundo, que motiva as mais variadas teorias da conspiração

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© fotos 1, 2, 5, 6, 8, 9, 10: Getty Images

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